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Foto do escritorRafael Torres

Richard Strauss - Sinfonia Alpina - Análise

Um Poema Sinfônico maduro de Richard Strauss (o bom). Não que os outros Strausses fossem ruins. Joseph, Johann e Johann II Strauss eram compositores de valsas e polkas vienenses. É música de ocasião, que não tem uma gota da relevância da de Richard. Vale lembrar que é um nome muito comum na Alemanha e Áustria, e, enquanto os três valsistas eram parentes, esse aqui não tinha nada a ver com eles.

Richard Strauss
Richard Strauss, o Strauss que importa.

A Sinfonia Alpina marca a volta dele aos seus queridos Poemas Sinfônicos, depois de 11 anos compondo ópera e dedicando-se à profissão de regente. Dizem que foi um dos maiores maestros de todos os tempos. Mas sobraram poucas gravações e o som é bem ruim. O que eu sei é que ele era um excelente orquestrador.


A música de Strauss não é estruturalmente complexa: geralmente é dividida em episódios bem narrativos, com título e tudo. Não é profunda, também, mas é altamente atraente, bem feita, polifônica e demonstra um talento absurdo para lidar com várias texturas instrumentais ao mesmo tempo.


Dura uma quase hora, mas você não sente o tempo passar. É a descrição de uma excursão pelos Alpes que ele fez quando menino, começa descrevendo uma noite e termina na outra noite.


Abaixo, nossa habitual Orquestra da Rádio de Frankfurt (hr-Sinfonieorchester), sob a excelente regência de Andrés Orozco-Estrada. É sempre bom ver uma orquestra com tantas mulheres, inclusive nas cadeiras mais importantes.

Não vou fazer uma análise de verdade, como as outras. Com cada aparição de cada tema e tudo. Porque os movimentos têm nomes que descrevem exatamente o que Strauss queria dizer.


A Obra

O Heimgarten, na Bavária, fonte de inspiração para a obra.

Ele pede uma orquestra imensa. Uma das maiores que eu já vi.

Máquina de Vento
Máquina de Vento.

4 Flautas (2 alternando para Flautins)

3 Oboés (1 alternando para Corne Inglês)

1 Heckelphone (um Oboé mais grave)

1 Clarinete em Mi bemol

2 Clarinetes

1 Clarinete Baixo (alternando para Clarinete em Dó)

4 Fagotes (1 alternando para Contrafagote)


8 Trompas (4 alternando para Tubas de Wagner)

12 Trompas fora do palco

4 Trompetes

2 Trompetes fora do palco

4 Trombones

2 Trombones fora do palco


Tímpanos - 2 Timpanistas

Percussão

Glockenspiel

Máquina de Vento (Wind Machine)

Máquina de Trovão (Thunder Machine)


Celesta

Órgão

2 Harpas


18 Violinos 1

16 Violinos 2

12 Violas

10 Violoncelos

8 Contrabaixos


Strauss escreveu, após a morte de Gustav Mahler, em 1911:


"A morte desse desejoso, idealista, energético artista é uma perda grande... Mahler, o Judeu, poderia atingir a elevação através do Cristianismo. [Mas] é claro para mim que a Alemanha só atingirá nova energia criativa se se libertar do Cristianismo... Eu vou chamar minha Sinfonia Alpina: Der Antichrist, pois ela representa: purificação moral da pessoa através da sua própria força, libertação através do trabalho, adoração da eterna e magnífica natureza."


Mais tarde, com a chegada do Nazismo, ele ficaria meio encantado com o movimento e se complicaria um pouco, apenas posteriormente o renegando. Mas aqui vemos um cidadão praticamente ateu, louvando um judeu e a natureza.


E o tema dessa obra é esse: a adoração à natureza. Vamos aos movimentos.


I. Noite (43s)

Repare nesta descrição da noite, com os sopros graves, como se tudo fosse difícil de enxergar. Os primeiros raios de sol são representados por duas notinhas nas flautas, trompetes etc.


II. Alvorada (4m17s)

Depois de um crescendo, o sol finalmente aparece, triunfante. É um movimento curto, todos são tocados sem interrupção.


III. A Subida (6m01s)

A subida começa nos graves (contrabaixos). A escrita orquestral é simplesmente arrebatadora, os metais aparecendo bastante. Perto do final a gente ouve os metais que estão fora do palco, para dar uma ideia de distância.


IV. Entrada na Floresta (8m21s)

Começa com um acorde menor ameaçador, mas ameaça vai diluindo. Aqui transparece bem a facilidade que ele tinha de lidar com várias texturas concorrentes (muita informação musical acontecendo ao mesmo tempo). Eventualmente temos um segundo tema super tranquilo, com solos de cordas ecoados pelas cordas em tutti. A tranquilidade é total, e eu realmente não entendo o acorde inicial ter sido tão dramático.


V. Passeando pelo Riacho (13m57)

O riacho é um movimento bem curto, e o personagem parece estar encantado.


VI. Na Cachoeira (14m47s)

A cachoeira é representada pelo burilar das madeiras, assim como as harpas.


VII. Aparição (15m01s)

Aqui é como se eles vissem algo na mata, mas não algo assustador. Talvez animais. Talvez a "Fada dos Alpes". A música é muito bonita. Ouve-se os pássaros.


VIII. Sobre Prados Floridos (15m49s)

Outro movimento bem curto. O personagem está em paz. Repare novamente nas texturas.


IX. Sobre o Pasto Alpino (16m51s)

Aqui ouvimos os sinos das vacas e melodias gloriosas. A orquestração se torna mais esparsa.


X. Sob Arvoredos e Vegetação Rasteira no Caminho Errado (19m29s)

Aqui a instrumentação adensa um pouco, com muitos elementos nas madeiras e metais.


XI. Na Geleira (21m03s)

Outro acorde menor representa a vasta geleira. A amplitude também é representada pelas notas mais longas da música.


XII. Momentos de Perigo (22m22s)

Com o tema principal e uma escrita jocosa, o perigo deve ser de escorregar. Eles andam com cuidado, pelo que se percebe. Observe, aos 23m15s o heckelphone, uma espécie de oboé tenor (uma oitava abaixo do oboé).


XIII. No Cume (23m54s)

Uma subida no trompete nos leva ao cume da montanha, onde a vista é ampla e bela, assim como os sons. Tem um belo solo de oboé, representando a solidão daquele lugar. Em outros momentos a música é majestosa, nas cordas. É realmente emocionante.


XIV. Visão (29m43s)

Uma visão calma. Aqui temos a solos de sopros, bem como a entrada do órgão (32m51s).


XV. Névoa Subindo (33m41s)

Os fagotes, depois os clarinetes, representam a ascenção da névoa. A escrita se torna turva, como não poderia deixar de ser.


XVI. O Sol Gradualmente Obscurece (34m)

Com uma escrita charmosa, ele evoca o leitmotif do sol, usado na Alvorada.


XVII. Elegia (34m53s)

Um canto em uníssono das cordas representa um estado de espírito mais funesto. Ouve-se bem o órgão nessa parte. E o heckelphone.


XVIII. Calmaria Antes da Tempestade (37m02s)

Começam a se ouvir trovões ao longe (tímpanos). O clarinete, o heckelphone e a flauta dominam o movimento. Depois ouvem-se os primeiros pingos de chuva (notas staccato no oboé), que vão se tornando cada vez mais frequentes. E mais trovões. E vento (veja a máquina de vento, aos 40m10s).


XIX. Trovão e Tempestade, A Descida (40m19s)

Até que a tempestade cai, com uma escrita orquestral magistral. Aqui ele usa a máquina de vento, um instrumento que era novo e foi usado até com certa frequência no começo do século XX. Veja as Tubas de Wagner, aos 41m16s. Quando ela vai terminando, ouvimos de novo os últimos pingos d´água, nos oboés e pizzicatos das cordas.


XX. Por do Sol (44m21s)

Aqui ele faz uso do tema da noite, nos sopros. Logo entram as cordas, para dar um toque mais mágico ao momento.


XXI. O Silêncio Assenta (46m56s)

Impossíver retratar silêncio com música, certo? Mas o que ouvimos aqui é principalmente o órgão em piano (baixinho). Alguns sopros se juntam calmamente a ele. O movimento é plácido e belo.


XXII. Noite (54m28s)

Aqui temos uma quase repetição do primeiro movimento. Com aquelas escalas descendentes e os acordes dos metais. A obra acaba serenamente, todos os perigos já passaram.


A Recepção


Sinfonia Alpina foi estreada em outubro de 1915, em Berlim, com Strauss regendo a Dresden Hofkapelle. As reações foram diversas, com alguns chamando pejorativamene de "música de cinema" (que é mais efeito do que conteúdo).


Mas hoje é uma das obras mais queridas de Richard Strauss. Ele mesmo gostava bastante dela. Apesar do nome Sinfonia, ela está mais para um Poema Sinfônico, ou seja, é completamente descritiva e episódica, tendo, de sinfonia, apenas a duração.


Gravações recomendadas


- Richard Strauss regendo a Orquestra do Estado Bávaro - É a melhor gravação de Strauss dessa obra, pelo som de 1941. É um documento importantíssimo, e a interpretação é impressionante.


- Georg Solti com a Orquestra da Rádio Bávara - Essa, de 1979 tem um som impressionante. Solti faz a orquestra se soltar e exibir um som mágico. É a minha favorita.



- Herbert von Karajan regendo a Filarmônica de Berlim - De 1980, é a última gravação da sinfonia por Karajan. O som é muito bom, e é considerada uma gravação de referência.


- Vladimir Jurowsky com a Filarmônica de Londres - É a gravação moderna que eu recomendo. É de 2018. As texturas são cristalinas e a grandiosidade está presente.


Comente o que achou. Gostou da Sinfonia Alpina? Veja aqui, como ouvir música clássica.


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