Já tendo falado sobre os outros 3, detenho-me agora no 4º Concerto para Piano de Sergei Rachmaninoff. Ele definitivamente não é o mais gostado dos 4. O 1º é considerado um começo promissor; o 2º, a volta por cima (depois de um fiasco com a 1ª Sinfonia); e o 3º, a montanha, o Everest. O 4º é a ovelha negra. Ele foi considerado por muito tempo uma obra sem atrativos, com pouca fluidez, problemas de continuidade, temas pouco cativantes. Enfim, uma obra árida. Vamos já discordar.
Composto em 1926, publicado em 1928 e, finalmente, revisado e republicado em 1941, o concerto teve poucas execuções por parte do próprio compositor, que se abatia facilmente com críticas e recebeu algumas nessa obra. A estreia teve uma reação fria. O público queria o famoso, velho e conhecido Rachmaninoff, mas ele lhes deu um Rachmaninoff Belle Époque, um tanto industrial, sofisticado. Só que ele realmente esqueceu de colocar um tema forte no primeiro movimento e no segundo. O terceiro também é um pouco confuso. Mas calma!
Dito isto, bora defender a obra. Eu demorei a me apaixonar pelo 4º Concerto. Poucos pianistas o gravam individualmente: mas muitos o gravam quando querem lançar uma coleção com os 4 mais a Rapsódia Sobre um Tema de Paganini. De forma que ele foi muito gravado. Certamente mais de 50 vezes, sem contar gravações ao vivo.
O pianista mais importante a gravá-lo solto, independente dos outros 3, foi Arturo Benedetti Michelangeli. O genial italiano, conhecido por ter um repertório não muito vasto e por se dedicar mesmo às obras que escolhia (eram poucas comparadas a outros pianistas, mas ainda eram em número considerável), nem tomou conhecimento dos 3 primeiros, mas defendia o 4º. Fez uma gravação maravilhosa, com a orquestra Philharmonia, regida por Ettore Gracis, que deve ser a mais perfeita. É considerada uma gravação de referência. No final deixo algumas sugestões de gravações.
O Primeiro Movimento começa agitado, a melodia é apresentada pelo piano ecoado pelas madeiras em tremolo. O corne inglês apresenta um motivo importante, assim como a flauta. Mas o segundo tema também é do piano. São temas que, pelo menos pra mim, depois que você se acostuma, mostram sua beleza. O movimento é cheio de momentos que você tem que prestar atenção pra perceber que são notáveis. Quando a música entra na sua cabeça, aí toda a sua beleza vem em cada audição. De todos os concertos de Rachmaninoff, esse é o que retem mais a característica de cada vez que você escuta, mais ele se torna atraente.
O Segundo Movimento é um Largo de beleza serena e nostálgica. O ponto culminante é lá pelos 5 minutos, quando ele vai crescendo e desemboca num momento tão sublime que é arrebatador. Pra ser justo, ele já tinha feito a mesma coisa num Étude-Tableau de 1911 que não foi publicado senão postumamente (o compositor morreu de câncer em 1943, aos 69 anos). É o Étude-Tableaux Op. 33, Nº 3, que vai escalando e tem o mesmo desfecho.
O Terceiro Movimento é mais problemático. Destituído do momento de triunfo típico do compositor, como tão eloquente no Concerto Nº 2 e sublime no Nº 3, ficou ele um tanto sem propósito. Mas não que seja desinteressante. Era apenas questão de marketing, deixar uma bela explosão pra fechar a obra. Não o fazendo, manteve sua integridade (sua, pessoal, e do concerto), à custa do amor do público.
Mas ouça o que eu estou dizendo: depois de se acostumar, você vai amar esse concerto, com curvas agudas e orquestração eficiente e muita beleza. Veja algumas opções de gravações:
- Sergei Rachmaninoff, com a Orquestra de Filadélfia, regida por Eugene Ormandy;
- Vladimir Ashkenazy, com a Orquestra do Concertgebouw de Amsterdã, sob a regência de Bernard Haitink;
- Arturo B. Michelangeli, com a Orquestra Philharmonia, sob Ettore Gracis;
- Tamás Vásáry, com a Sinfônica de Londres, sob Yuri Ahronovitch;
- Alexander Ghindin, com a Filarmônica de Helsinki, sob Vladimir Ashkenazy (essa é a primeira gravação da primeira versão do concerto, a que se toca mais é a de 1941. O próprio Ashkenazy gosta mais dessa versão. Eu acho a última mais satisfatória.)
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