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Orquestra de Cleveland - As Melhores do Mundo 8

Foto do escritor: Rafael TorresRafael Torres

Atualizado: 8 de nov. de 2024

Por Rafael Torres

É uma orquestra relativamente "jovem", apareceu no cenário musical nos anos 60, sob a direção do húngaro George Szell.


A cidade de Cleveland não é, nem mesmo, a capital do seu estado, Ohio. Esta é Columbus. Em um país em que não falta(va) dinheiro, a distinção entre capital e interior não é tão importante. Outra orquestra do mesmo estado que impressiona é a Orquestra Sinfônica de Cincinnati.


Mas o que faz a Orquestra de Cleveland (eles não se denominam 'Sinfônica' nem 'Filarmônica', mas adotaram o artigo: 'The Cleveland Orchestra') ser considerada uma das melhores do mundo (não só por mim) é a tradição. Ela teve a chance de, no momento mais importante da história, para as orquestras, o pós-guerra, contratar um regente que deu muito certo: George Szell.


George, já nos testes, impressionou o público (naquela época o público frequentava os testes). Os Estados Unidos, que ainda não detestavam imigrantes (acho que, Europeus, ainda não detestam) lhe deram o poder e as condições financeiras para substituir músicos como quisesse, a fim de tornar a orquestra a "Melhor da América" (palavras suas).


Ele foi contratado em 1946. Em 1959, levava a orquestra para a sua primeira turnê europeia (Europa ocidental e oriental). Em 1960, a "casa" da orquestra, o Severance Hall, passou por reformas para melhorar sua acústica, o que, por si só, contribuiu muito com a qualidade do conjunto, já que os músicos podiam se ouvir melhor. Ele insistiu em uma estrutura que ficou conhecida como "concha de Szell".


Em 1967 eles foram a primeira orquestra não-europeia a ser convidada para os três maiores festivais de música clássica: o de Edimburgo, o de Salzburgo e o de Lucerna. Isso, pouco depois de fazer sua segunda turnê europeia, em que tocaram em Moscou, Leningrado, Tblisi e Kiev. Szell supervisionou a construção do Blossom Music Center, que dava à orquestra a possibilidade de tocar (e ganhar dinheiro) no verão.


E o mais importante para a propagação da orquestra, consolidou uma parceria com a gravadora Epic, parte da Sony (atual Sony Classical). Já havendo gravado com grandes orquestras na Europa, como a Filarmônica Tcheca e a Sinfônica de Londres, nos Estados Unidos ele trabalhou com solistas de nome (e locais), como o pianista Leon Fleisher - para que se tenha uma ideia, a gravação deles dos 5 concertos de Beethoven é considerada até hoje uma das mais importantes da história.


Compreendendo que a gravação era o melhor cartão de visita da orquestra, chegava a gravar, por ano, 5 a 10 álbuns (e você os encontra no Spotify, em Sebos de Vinil e CD, YouTube etc.). Eles gravavam de Haydn, especialidade de Szell a Richard Strauss, compositor do século XX e orquestrador dificílimo. Tudo para criar a impressão, no público, de que se tratava da orquestra mais ágil e versátil do mundo. O público, que dificilmente tinha acesso a gravações europeias, acreditava. E, até certo ponto, com razão. Porque a Orquestra de Cleveland havia atingido um patamar em que podia ser comparada a qualquer outra, sem sair perdendo. Mas, também, sem necessidade.


Gravações lendárias, eles fizera dos dois concertos para piano de Brahms. As com Leon Fleisher só tinham uma concorrente. As de Szell/Cleveland, mesmo, com Rudolf Serkin. Além disso, todo ano Szell gravava com a Sinfônica de Londres, com a Orquestra do Concertgebouw e com a Columbia Symphony Orchestra. E música de câmara (era excelente pianista).


 

A Sala


A Orquestra, fundada em 1916, ganhou sua sala de concertos em 1931, a Severance Hall.


Visão interna do Severance Hall.
Visão interna do Severance Hall.

Com as reformas sugeridas por Szell, em 1960, tornou-se, além de bela, uma sala confiável, em que os músicos podem se ouvir com rapidez, o que contribui para que a orquestra seja ágil como poucas.


E, como a Severance Hall é uma sala de inverno, tornando-se muito quente no verão, era comum que as orquestras dos Estados Unidos fizessem suas temporadas apenas na estação fria. Mas algumas, como Cleveland, podiam dar-se o luxo de construir uma outra sala, que abrigasse concertos no verão. É o caso do Blossom Music Center, que, desde 1968, abriga os concertos de verão de Cleveland.


Visão externa do Blossom Music Center.
Visão externa do Blossom Music Center.
 

Os Regentes


Seis regentes (ao menos até 2027) compõem o compacto rol da Orquestra de Cleveland. Isso é bom para ela, que está sempre sendo disputada, e que não tem que mudar seu som a cada novo contratado.


  • Nikolai Sokoloff (1918-1933) - Regente ucraniano. Havia sido diretor musical da Sinfônica de San Francisco, onde trabalhara para que a orquestra contratasse mulheres e as pagasse o mesmo que a homens. Em Cleveland, gravou a 2ª Sinfonia de Sergei Rachmaninoff.

  • Artur Rodziński (1933-1943) - O polonês já era conhecido, quando nomeado regente titular da orquestra. Ele adicionou ópera (eca!) ao repertório da orquestra e, especialmente, música moderna, gravando 'A Sagração da Primavera', de Igor Stravinsky, mais Debussy e Shostakovich.

  • Erich Leinsdorf (1943-1946) - Regente austríaco muito respeitado, trabalhava na Metropolitan Opera, de Nova Iorque. Estavam, ele e Szell, bem cotados na disputa para ser o próximo regente principal da Orquestra de Cleveland. Ele ganhou. Mas só por três anos. Nesses três anos, Leinsdorf contribuiu significativamente com o aumento da fama da orquestra, inclusive com a negociação para que ela participasse, todo domingo, de um programa de rádio, que a permitia ser ouvida em boa parte do mundo (América do Sul, inclusive).

  • George Szell (1946-1970) - O húngaro foi o primeiro a gravar abundantemente. Como o repertório era, queira ou não, limitado (e, também, os avanços nas técnicas de gravação, tornavam o investimento necessário completamente justificável), gravou obras duas, às vezes três vezes. Em 1970 ele não ia bem de saúde. Fez seu último concerto no Alaska, quando, no meio da apresentação, sentiu uma dor no peito. Faleceu em 30 de julho de 1970.

  • Lorin Maazel (1972-1982) - Regente americano, o único (americano), até hoje, a ser regente principal de Cleveland, Maazel era um talento notável, tendo regido pela primeira vez aos oito anos de idade. Em 1972 ele já tinha trabalhado na Deutsche Oper Berlin (de 1965 a 1971) e na Deutsche-Symphonie-Orchester Berlin (de 1964 a 1975). Quando veio a Cleveland, teve uma passagem excelente, mas foi sondado, nos anos 1970 pela Ópera de Viena, trabalho irrevcusável. Em seu último período em Cleveland, regeu apenas sete dos concertos programados para o ano inteiro. Seu sucesso na Europa era avassaloador. Maazel fora casado com uma brasileira, falava português (tenho um disco em que ele narra 'Pedro e o Lobo', de Sergei Prokofieff) e morreu em 2014.

  • Christoph von Dohnányi (1984-2002) - Regente alemão. Quando eu comecei a comprar CDs, o maestro de Cleveland era esse aqui. Sempre gostei muito dele (neto do compositor Ernst von Dohnányi), com um repertório enorme e competente em todo ele. Regia Beethoven com segurança, Schumann com elegância e Dvořák com seriedade. Quando acabou seu contrato, foi nomeado diretor laureado pela orquestra. Durante sua passagem, nos anos 90, a orquestra levantou fundos para remover a "concha de Szell" e recolocar o órgão no palco.

  • Franz Welser-Möst (desde 2002) - Regente austríaco altamente prestigiado, Welser-Möst tem feito uma discografia muito boa e ganhado muitos prêmios por ela. O fato é que a indústria de gravações de música clássica, enquanto cresce no Brasil e na America Latina, tem decrescido, por várias razões, na Europa e nos Estados Unidos.


 

Discografia Sugerida


Além de gravar com seus titulares, a orquestra fez diversos registros com regentes convidados, como o francês Pierre Boulez e o russo Vladimir Ashkenazy.


- W. A. Mozart - Concertos para Piano Nos. 9, 17, 18, 19, 20, 21, 23, 24, 25 e 27 (são 5 CDs) - Acho mesmo que a pianista nipo-inglesa Mitsuko Uchida tinha pretensões de gravar pela segunda vez os concertos de Mozart regendo do teclado a Orquestra de Cleveland. A primeira foi uma das primeiras gravações dela, com a Orquestra de Câmara Inglesa e o regente Jeffrey Tate. Esta daqui, iniciada quase vinte anos após o término da anterior, não nos revela uma artista mais 'madura', 'sábia', nem nada. Mas, em alguns concertos (20, 21, 24, 25, 27), o som é tão bom, que você dá graças aos céus por Mitsuko ainda estar ativa. São as melhores gravações destes concertos de Mozart. E são ao vivo, mas tiveram a delicadeza de remover os aplausos e 'bravos' no final (ao menos na master que foi ao Spotify e, acredito, outras plataformas de streaming que ganham bilhões às custas dos artistas que, estes sim, fazem todo o trabalho).


- W. A. Mozart - Concertos para Clarinete, para Oboé e para Fagote - Com Christoph von Dohnániy, Franklin Cohen (clarinete), John Mack (oboé) e David McGrill (fagote). O melhor concerto de Mozart, melhor do que qualquer um para piano, é o para clarinete, seu derradeiro, sobre o qual estou escrevendo um artigo. Gravados entre 1991 e 1993 e lançados em 1995, os solistas, todos, pertencem ou pertenceram à Orquestra de Cleveland - decisão acertadíssima de Dohnányi. É um repertório relativamente pouco gravado, deixado como sobra às orquestras HIP. Engado crucial, são obras sinfônicas. O Concerto para Clarinete foi escrito uns 12 anos antes da 'Sinfonia Eroica' de Beethoven.


- Ludwig van Beethoven - As 9 Sinfonias - Em um dos poucos casos em que um titular gravou obras que um anterior já havia gravado (falo de George Szell e Christoph von Dohnányi) o velho Szell ganha em todas. Ele acerta a intensidade, o andamento, o clima... Fala a língua de Beethoven.


- Ludwig van Beethoven - Aberturas - Com George Szell. Um disco que facilmente passa despercebido na discografia de Szell é esse. Lançado em 1974, contém as aberturas 'Egmont', 'Coriolano', 'Rei Estêvão', 'Leonora 1', 'Leonora 2' e 'Fidélio'. Curiosamente, anos depois, von Dohnány gravou a 'Leonora 3', completando o ciclo com as principais aberturas.


- Ludwig van Beethoven - Os 5 Concertos para Piano - Com Vladimir Ashkenazy. No final dos anos 80 e início dos 90, o pianista e regente russo Vladimir Ashkenazy fez, com a Orquestra, a sua terceira gravação da integral dos concertos de Beethoven. Conhecendo as três, posso dizer que esta é a melhor. Mas apenas vagamente, cada uma tem seu charme.


- Franz Schubert - Sinfonia Nº 9, "A Grande" - Com Franz Welser-Möst. Esta sinfonia específica, junto com a , do mesmo Schubert, é muito gravada. Acho que vem no contrato "gravar a de Schubert"... Desse modo, fica difícil fazer a orquestra tocar com algo além de tédio. Mas não vi sinal de tédio nessa gravação de Welser-Möst. Ele conseguiu o impossível: trazer frescor a uma obra tão batida.


- Robert Schumann - As 4 Sinfonias - Com Christoph von Dohnányi. De Dóhnányi poderíamos escolher várias gravações. Aqui, a dosagem de grandeza com discrição está perfeita. O 3º movimento da 2ª Sinfonia é comovente, sem ser piegas. Na quarta, ele conseguiu arrancar da orquestra uma sonoridade europeia e, ao mesmo tempo estadunidense.


- Johannes Brahms - As 4 Sinfonias - Com Vladimir Ashkenazy. George Szell gravou bravamente as 4, algumas mais de uma vez. Mas aqui temos, em som nítido, uma grande interpretação de quatro grandes obras. E isso é importante. A minha sensação é que, nessas sinfonias, falta a Szell o mesmo que faltava a Dohnányi nas Sinfonias de Beethoven. Gana, estômago. Simplesmente não dá para ser elegante tocando essas obras.


- Johannes Brahms - Os 2 Concertos para Piano - Com Rudolf Serkin e a Orquestra de Cleveland regida por George Szell. George Szell e Cleveland não aparecem nesta lista minha das melhores gravações do 1º Concerto de Brahms. Mas aparece várias vezes nesta, referente ao 2º concerto. Estas gravações são pilares da história da música gravada.


- Antonín Dvořák- As 4 Últimas Sinfonias - São gravações quintessenciais destas 4 obras. Se não estiver enganado, ele gravou um CD com a , a e a e, depois, gravou a . São obras (a sétima, a oitava e a nona) que Szel já havia gravado com a orquestra. E muito bem. Mas a gravação de Dohnányi beira a perfeição e o som é muito mais equilibrado.


- Igor Stravinsky - A Sagração da Primavera - Com Pierre Boulez. Boulez gravou esta mesma obra, com a mesma orquestra, por duas vezes. Em 1969 e em 1992. Refiro-me aqui à gravação de 1992, que é mais limpa e tem um som melhor. Mas seja qual for, é um item obrigatório na discografia de qualquer de Boulez, da Orquestra de Cleveland ou de Stravinsky. Nota-se por que já no caos da introdução.



 

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A Arara Neon é um blog sobre artes, ideias, música clássica e muito mais. De Fortaleza, Ceará, Brasil.

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