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Foto do escritorRafael Torres

Papo de Arara: Entrevista com Leonardo Drummond, da Kuba Áudio

Atualizado: 8 de out. de 2020



Leonardo Drummond é um designer e empreendedor carioca que criou, em 2014, a startup Kuba, uma desenvolvedora e fabricante de fones de ouvido de alta performance. O Kuba Disco, seu produto mais importante até agora, foi o primeiro fone, digamos, audiófilo (eu e ele não somos muito fãs dessa palavra), 100% brasileiro. Em 2011 ele criou o blog Mind the Headphone: www.mindtheheadphone.com.br, que, em 2017 se tornou um canal de YouTube: https://www.youtube.com/channel/UC7fN3sq7h2BDFtBrzXWo4Zg. Mais abaixo eu explico algumas coisas sobre o mundo dos fones.


Veja a entrevista que ele gentilmente cedeu à gente.


Léo, o que define um entusiasta do som hoje?


Gosto muito dessa expressão porque me identifico muito mais com ela do que com “audiófilo”. Para mim, é simplesmente uma pessoa que se importa com qualidade de som e a enxerga como algo que pode melhorar sua relação com a música.

Quando você percebeu que tinha capacidade de distinguir e avaliar diferentes sonoridades de fones de ouvido?


A minha relação com a música veio de berço, porque sempre foi muito incentivada pelo meu pai. E, desde que me conheço por gente, me importo com qualidade de som. Algo que sempre conto é que, quando tinha por volta de 6, 7 anos, ouvia música com um Discman mas pegava o fone da minha mãe, porque era melhor que o meu. Então, sempre liguei para isso e sempre estive em busca de qualidade de som, mesmo que de forma mais leiga.

Tudo começou a mudar quando comprei meu primeiro fone mais sofisticado – na época, sempre que viajava comprava fones mais simples, mas nunca ficava satisfeito. Assim, vi que, para conseguir a qualidade que queria, provavelmente teria que fazer investimentos maiores. Então, em meu aniversário de 18 anos, pedi de presente um Shure SE530, e me apaixonei. Não muito tempo depois, acabei adquirindo um outro, o Sennheiser IE8, que tinha uma sonoridade muito diferente.

E a grande questão é que, para comprar esses fones, lia reviews incessantemente. E, quando em uma discussão em uma comunidade do antigo Orkut mencionaram esses dois fones que tinha, dei minha opinião – e aí me pediram para fazer um review sobre eles. Este foi meu primeiro review.

Uma das maiores máximas da audiofilia é que se você tem um bom fone por um preço X, ao comprar um novo fone de preço 10X você certamente não terá 10X mais performance. Isso, até onde eu entendo, vale para muitas coisas na vida. Mas existe algo que você considera extravagância?


Essa é uma pergunta difícil... até porque, a minha definição de onde se cruza a linha do razoável é apenas a minha opinião, e não dá para julgar o que outras pessoas consideram um bom investimento – mesmo se o que elas estiverem buscando for luxo ou status, que são atributos importantes pra várias pessoas.

Eu, pessoalmente, não considero comprar fones de mais de 1.000, 1.500 dólares (existem modelos muito mais caros) – mas sei que, pra muita gente, isso já seria considerado uma enorme extravagância.

O fator psicológico tem muita influência na percepção de um som? Ou seja, posso gostar mais de um fone pela circunstância (ou até pelo estado de humor) em que experimento ele?


Com toda certeza. Acho que, nesse hobby, as pessoas superestimam demais os sentidos e não percebem a enorme quantidade de fatores envolvidos em nossa percepção sobre alguma experiência sensorial – como a audição de um fone de ouvido.

Você já deve ter ouvido que o hobby (audiofilia) é “elitista”. O que responde?


Depende do ponto de vista. Acho sim que existe uma “ala” audiófila esnobe, elitista e preconceituosa. E essa ala, infelizmente, não é pequena...

Por outro lado, cada vez mais existem equipamentos baratos que oferecem muita qualidade de som. Então, se você sair um pouco da neurose de querer sempre o melhor e mais novo, e focar mais no que está faltando do que naquilo que você tem, vai ver que nunca houve momento melhor para gostar de áudio.

Você já me falou que gosta de música clássica, como Scriabin, Tchaikovsky. Isso é um outro tipo de interesse, não necessariamente relacionado ao mundo da apreciação de fones e equipamentos de som. Como você desenvolveu esse interesse? Tem alguma formação musical?


Meu pai sempre gostou de música, mas não tem formação. E ele é especialmente apaixonado por música erudita. Então fui apresentado ao “estilo” ainda criança, mas nunca tinha sido algo que me encantasse. Mas, quando fui fazer o ensino médio na Inglaterra, uma das matérias que tinha era música (eu já tocava baixo, mas ali eram aulas sobre história da música e teoria musical), e um dia ouvi a 9ª Sinfonia do Dvořák, e fiquei maravilhado. Mas essa acabou sendo apenas uma porta de entrada – depois, conheci melhor Sibelius, Tchaikovsky, Scriabin e outros, e foi aí que me apaixonei de verdade.

Eu fico muito curioso com relação ao fone Sennheiser HE-1, que custa o mesmo que um apartamento. Você pode descrever o que ouviu?


É uma experiência sublime, muito difícil de explicar. É como se você enxergasse tudo... como se tudo fosse palpável e verdadeiro. Orgânico e realista. Nesse mesmo dia, havia um Sennheiser HD800S para audição também. Ao lado do HE-1, parecia um fone de brinquedo.

Fale um pouco sobre sua marca de fones, a Kuba? Sobre o Disco, o Mali e o Pro.


A Kuba é minha startup – uma marca que criei, junto a 3 outros sócios (hoje só eu e mais uma), porque acreditamos que é possível criar produtos diferentes. O mercado de fones no Brasil nos parece muito comoditizado – com marcas que não estão tão interessadas assim no mercado brasileiro. Os produtos sofrem de obsolescência programada, não têm peças de reposição, a assistência técnica é difícil, a experiência de compra não é das melhores...

Queremos fazer diferente. Então, com o Disco, queremos trazer um design diferente de tudo o que existe no mercado nacional; qualidade de som de fones muito mais caros; e todas as peças substituíveis. Já com o Mali, o objetivo é entregar a experiência sonora que consagrou o Disco em um pacote muito conveniente – também a um preço inferior ao dos concorrentes. Já a linha Kuba Pro vem da nossa vontade de entrar no mercado profissional, entregando produtos de altíssimo desempenho, para uso em palco, com toda a segurança de comprar de uma empresa nacional, com suporte técnico fácil e acessível.

E projetos futuros para a Kuba?


Temos muitas ideias – algumas delas são novas variações do Kuba Disco, como versões bluetooth, Pro e gamer, um headphone de entrada, mais barato e, em algum momento, um headphone aberto também.

Vocês empregam quantas pessoas? Quantas trabalham diretamente na construção dos fones?


Hoje, somos 8 pessoas, incluindo eu e minha sócia, Eduarda. Oficialmente, duas pessoas são responsáveis pela montagem – porém, em épocas com muitos pedidos, todos nós acabamos participando da montagem, exceto pela Isabela e a Livia, que trabalham no atendimento, em home-office.

Seu canal no YouTube, o Mind the Headphone, surgido a partir do seu blog homônimo, é muito apreciado (lembro que a primeira coisa que comentei foi sobre o seu português ser muito bom!). Há uma equipe ali? Ou é só você?


Obrigado, Rafael! Por enquanto, sou apenas eu mesmo. Mas adoraria contratar um editor de vídeos.

Posso te pedir um top 10 dos fones que já ouviu?


Difícil... vou dizer os que me vêm à cabeça, mas alguns deles não é tanto pelo desempenho final, e sim pelo conjunto – e aí o preço também conta:


- Sennheiser HE-1

- Sennheier HE-90

- Stax SR-007

- Sennheiser HD600

- ZMF Verité

- Grado HP1000

- Grado RS1i

- AudioDream AD8

- Hifiman Edition X V2

- Sennheiser HD800





A Arara agradece muitíssimo ao Léo pela entrevista. Eu posso dizer que sou dono de um Kuba Disco e que, basicamente, só o tiro da cabeça para o banho. Sonoridade espetacular, graves limpos e com impacto, sonoridade bem linear. Agora, o que eu não sei, e que o Léo sabe, é descrever um fone em 30 parágrafos. Se soubesse, o Disco teria só elogios. Mas a Arara vai explicar alguns pontos.


Os tipos de fone mais comuns:

- Headphones Abertos - geralmente têm maior fidelidade ao som gravado, por isso, são muito usados por engenheiros de som para mixar e masterizar. A desvantagem dos fones abertos é que eles vazam muito som, ou seja, tanto você vai ouvir muito do ambiente, quanto a pessoa que está ao seu lado vai ouvir sua música;

- Headphones Fechados - existe uma barreira física que não permite que o som que você ouve saia pela parte de trás das conchas. Geralmente agradam mais ao público sem muito treinamento no ouvido, pois os graves costumam ser bem definidos;

- Headphones Semi-abertos - fica entre os dois aí de cima, tendo parte das vantagens de cada um e parte das desvantagens;

- Headphones Bluetooth com Noise Cancelling - eles, obviamente, não têm fios, o que, de certa forma, lhes dá uma desvantagem: o som carregado pelo bluetooth ainda não tem a qualidade de um bom fone cabeado. A tecnologia Noise Cancelling, ou Cancelamento de Ruído, capta o som ao seu redor e envia uma série de frequências de resposta que, literalmente, anulam o som exterior. Você pode estar num avião: só vai ouvir um leve ruído de fundo, e só quando a música pausar. A desvantagem é que quando a sua esposa (experiência pessoal, snif, snif) quer falar com você, nem adianta gritar. Eu fico olhando pra ela de vez em quando pra saber, mas ela só resolve falar comigo naquele momento preciso em que eu fecho os olhos.

- In-ears - são os intra-auriculares, aqueles que vêm com o celular. Vão desde um som porcaria até algumas das sonoridades mais refinadas e fieis do mercado;

- True wireless - são intra-auriculares que operam por bluetooth. Como aqueles AirPods. Eu tive quando a tecnologia ainda estava no começo, então, não sou bom pra avaliar.

- Além isso, os headphones, que são os que ficam sobre as orelhas, empregam diferentes tecnologias: tem os dinâmicos, os eletrostáticos, os planar-magnéticos etc. Os dinâmicos formam a maioria.


Fatos:

- Alguns dos melhores fones são abertos. Sennheiser HD 600, Hifiman HE-560, Beyerdynamic DT 990 e os utópicos Sennheiser HE-1, Focal Utopia e Meze Empyrean.

- Alguns fechados excepcionais: Kuba Disco, Sennheiser HD 569, Sennheiser HD 820, Byerdynamic DT 770.

- A engenharia necessária para se fazer um fone é muito precisa. Além do que, o engenheiro tem que fazer diversas escolhas. Por exemplo, graves muito fortes podem ser interessantes, mas geralmente vão inundar os médios, isto é, tirar a clareza deles. Achar a medida ideal das coisas é difícil.

- Existem fones "quentes", isto é, geralmente mais agradáveis de ouvir, com um pouquinho de cremosidade nas frequências certas; e existem os "analíticos", que mostram o som mais fiel possível ao que foi gravado. Os "audiófilos" preferem os últimos, pela pureza. O público em geral prefere os mais quentes, que, inclusive, redimem gravações ruins.

- Há uma espécie de Terraplanismo no mundo dos fones de ouvido. A crença no burn in. Que é expor o fone a 200-300 horas de ruído rosa (um barulho que contém todas as frequências audíveis, semelhante à estática de TV) para, digamos, amaciar e revelar o som final dele. Alguns audiófilos mais puristas creem 100% nisso. Mas a maioria diz que é balela. Até a ciência diz que isso é mito. A minha tendência é não acreditar, mas eu posso jurar que o meu Kuba Disco alternava entre soar bem e mal até a segunda semana, ou seja, depois de um pouco "gasto".


Confira o canal do Léo.

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