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Um Cogumelo Alucinógeno para Depressão - Psilocibina

Atualizado: 11 de jan.

Por Rafael Torres.

Editado e Aprimorado em 16 de dezembro de 2023.


Este texto, caótico, extenso e detalhado como é, é o exato texto que eu queria ter lido anos atrás, quando comecei o tratamento para Depressão Maior. Ele existe para o leitor, especialmente aquele que sofre deste mesmo mal ou que convive com alguém que sofre. Por esta razão, o leitor que não se enquadra nesse perfil vai se deparar, constantemente, com palavras que parecem se dirigir pessoalmente a si, mas não fazem um sentido absoluto.


A lição final, darei logo: nunca desista. O suicídio não é produtivo. Não traz benefícios a ninguém e (sabe-se lá o que vamos encontrar depois da morte), possivelmente, não resolve nada. Por mais profunda que seja a dor e por mais desanimadores, ou até desesperadores, que sejam os pensamentos, há sempre um novo remédio, uma nova terapia, um novo tratamento. Isso (a experimentação constante de remédios, terapias e tratamentos) me manteve vivo até hoje. E haverá de manter mais um bocado.


Nós, depressivos, nos entendemos. Sabemos, ou, pelo menos, julgamos saber o que é a verdadeira dor. Aquela que a psicanálise, de maneira tão certeira, alcunha de "dor de existir". Uma dor pior que qualquer tortura. A tortura que vem de dentro.


Os cogumelos que contêm Psilocibina devem ser ingeridos apos desidratados.
Os cogumelos que contêm Psilocibina devem ser ingeridos apos desidratados.

 

Primeiramente, Alguns Esclarecimentos


Drogas


Na terminologia que usamos no Brasil, o termo "droga", não descreve, geralmente, medicamentos, ou seja, fármacos. Em alguns países, no entanto, como os Estados Unidos, a palavra "drug" pode se referir tanto a um remédio quanto à mais prejudicial e ilícita substância psicoativa. Nós vamos nos ater ao sentido atual da palavra no Brasil: uma substância cultivada, sintetizada, geralmente de maneira ilegal (mas nem sempre), ou buscada de outro país (traficada), que altera o estado de consciência do usuário. Para o bem ou para o mal.


O importante, aqui, é que conheçamos e saibamos diferenciar alguns dos tipos de droga. E, com isso, reduzir nossa natural antipatia e repulsa por alguns deles - e as dilatar, em outros. Temos:


  • O Álcool - mesmo não sendo ilegal, possui características que tornam seu consumo perigoso e viciante. Acredito que a postura social mais correta seria uma dentre as duas a seguir: 1. Seu banimento (que o tornaria ilegal e ele passaria a ser comercializado por organizações perigosas e fortemente armadas, de modo a bater de frente com as forças policiais, e, a pior figura do cenário, o consumo não seria inibido, nem mesmo de maneira sutil). 2. A legalização e regulamentação de outras drogas menos danosas (e apenas as menos danosas), elevando-as ao mesmo status do álcool.

  • Drogas Psicosilépticas ou Depressoras: como o ópio e a morfina, muito usados antigamente. O primeiro, como substância recreativa e o segundo, se formos crer nos filmes de guerra, como uma espécie de anestésico. Mas o membro mais conhecido desse grupo nos dias atuais é a Heroína. Esse tipo de droga causa uma diminuição da atividade cerebral, de modo que todo o organismo (e, naturalmente, o próprio comportamento da pessoa) fica lento. Causa vício após o consumo de poucas doses, tem alto potencial de tornar o usuário inútil socialmente e pode levar à morte;

  • Alucinógenos: podem ser sintéticos, como o LSD e o Ecstasy, ou naturalmente encontrados em cogumelos, como é o caso da Psilocibina e em plantas, como as que compõem o Chá de Ayahuasca (não, a planta não se chama Ayahuasca, ao menos no Brasil);

  • Drogas Estimulantes: Incluem-se a Cocaína, o Crack, a Metanfetamina e até mesmo a Cafeína. Essas substâncias fazem aumentar a atividade pulmonar, podendo proporcionar uma sensação de euforia e diminuição do cansaço, e fazem aumentar a sensibilidade dos sentidos, gerando, em certos casos, um estado de alerta e agitação. Algumas delas são extremamente danosas, destroem facilmente a vida do usuário e dos que o rodeiam, e matam, através da superdosagem.


Todos conhecemos a dramática jornada de um usuário de cocaína ou heroína. Ele fica viciado em pouco tempo; precisa de doses cada vez maiores para atingir seu efeito esperado; precisa de doses cada vez mais frequentes, também, já que o efeito vai durando menos tempo, quanto maior for o uso; seu comportamento muda negativamente; torna-se agressivo e difícil de conviver; depois que gasta todo o seu dinheiro com a droga, passa a usar o dinheiro alheio (com ou sem o consentimento da pessoa em questão); finalmente, com o aumento da dosagem e da frequência de utilização, a ocorrência de uma superdosagem (overdose), que pode ser fatal, vai se tornando inevitável.


O que a maioria das pessoas não sabe é que os chamados alucinógenos


As Drogas que Podem Ser Usadas de Maneira Proveitosa


(Proveitosa para algumas pessoas com saúde comprometida, diga-se.)


As substâncias com menor potencial danoso, mas que alteram o estado de consciência de quem as usa, vêm sendo estudadas pela medicina, pela indústria farmacêutica e pela neurociência desde os anos 1950, tendo sido detectados promissores materiais para o tratamento de Depressão e outros transtornos mentais. Vários estudos, alguns dos quais estão listados abaixo, apontam que substâncias não viciantes, como a Psilocibina, encontrada em um tipo de cogumelo, trazem benefícios terapêuticos maiores do que os mais modernos medicamentos.


Esses estudos mostram com cada vez maior eloquência que alguns alucinógenos podem fazer melhorar dramaticamente a qualidade de vida (potencialmente, inclusive, podendo salvar a vida) de pessoas com Estresse Pós-Traumático, Depressão Refratária (aquela que é resistente a tratamentos), Ansiedade Crônica, dependência de drogas viciantes e outros Transtornos de Personalidade.


Vídeo totalmente opcional:



Efeitos da Psilocibina


Não se sabe ao certo como tudo funciona. A Psilocibina, encontrada em cogumelos alucinógenos, por si mesma, não faz nada. O nosso corpo é que a converte em Psilocina, que é o verdadeiro agente psicodélico.


Sabe-se também que a humanidade descobriu e tira proveito de seus efeitos desde muito antes da história escrita. Na Espanha, nas proximidades da cidade de Villar del Humo, foram descobertas pinturas rupestres com 6.000 anos de idade, que, provavelmente, retratam o Psilocybe Hispanica, um dos cogumelos que contêm a Psilocibina e que abunda na região. Os Maias, ainda mais devotos, dedicaram verdadeiras esculturas em pedra à variante mesoamericana do fungo. Os Aztecas o chamavam de teonanácatl. Carne de Deus. Os povos siberianos fazem uso ritual e religioso do seu cogumelo Amanida Muscariamilhares de anos.


Pinturas rupestres que possivelmente retratam cogumelos alucinógenos. datadas de 6 mil anos atrás, na Espanha.
Pinturas rupestres que possivelmente retratam cogumelos alucinógenos, de 6 mil anos atrás, na Espanha.

Os efeitos comuns da ingestão da Psilocibina, que começam a se manifestar em cerca de 30 minutos, podem variar muito e dependem de fatores como conforto, estado psicológico e até mesmo da música colocada para ouvir. Em estudos realizados desde os anos 60, cientistas constataram que a experiência tende a ser mais prazerosa em pessoas que já fizeram uso de substâncias alucinógenas anteriormente e, também, mais positiva quando feita em grupos de até 5 pessoas. Os estudos foram feitos em grupos e dosagens de vários tamanhos.


Voltando aos efeitos. Depois de uma série de sintomas iniciais, que podem incluir tontura, náusea e, até mesmo, vômito, a pessoa passa a ter sensações agradáveis e elevação da empatia. Se administrada em uma dosagem específica, no seu apogeu, o indivíduo vivencia uma experiência mística, que, em seu estado perfeito, é a clara percepção de pertencimento ao universo, de se ter aprendido algo de extremo valor sobre a existência, conversado com o cosmos ou com o seu mais profundo subconsciente, além de alucinações visuais (que o indivíduo tem plena consciência de serem irreais e tem plena capacidade de diferenciá-las da realidade) e, em alguns casos, sinestesia, uma espécie de confusão que ocorre com os sentidos (a pessoa acha que certa música tem cheiro de alecrim ou sente cócegas na mão ao se deparar com a cor lilás, por exemplo).


 

Ao Início


Uma história que meu irmão me contou e que nunca saiu da minha cabeça: no colégio, a psicóloga vai até as salas para se apresentar. Quem precisar de ajuda, estiver se sentindo diferente, triste ou raivoso, pode procurar por ela. Para ganhar a cumplicidade e a simpatia dos alunos, ela tem várias frases de efeito. Mas a da escola do meu irmão soltou uma verdadeira pérola: "Psicólogo não é médico de doido!", ela afirma. "Psiquiatra é que é."


Falta de preparo total da moça! Mas uma coisa estava certa nessa situação: toda escola tem que ter psicólogos. De preferência, bem esclarecidos. Eu ri muito quando ele me contou, sem prever que, em pouco tempo, eu seria conhecido por todos os "médicos de doido" de Fortaleza.



 

Pesquisas (algumas das quais estão listadas no final do texto) indicam que um cogumelo alucinógeno que contém psilocibina, quando comparado, por exemplo, ao Escitalopram (um de seus nomes comerciais é Lexapro), tem um efeito terapêutico muito superior e mais rápido que o do remédio no tratamento à depressão. Li muitas informações sobre isso, mas o que eu queria era fornecer uma experiência em primeira mão, em primeira pessoa, sem os comprometimentos de uma reportagem.


Primeiramente vou fazer uma breve síntese sobre o tratamento, vou tentar explicar leigamente como funciona a Depressão e os remédios e, por fim, me aprofundo na minha experiência, tanto com a Depressão, quanto com o cogumelo. A Psilocibina, agente alucinógeno presente em alguns cogumelos, tem sido testada no mundo inteiro como tratamento para pessoas com Depressão Resistente a Tratamentos (DRT), igualmente conhecida como Depressão Refratária. A primeira coisa que você deve saber é que, assim como o LSD, a Psilocibina não vicia. E, nas dosagens propostas, não causa efeitos colaterais significativos. O paciente deve administrar (engolir, mesmo) os cogumelos na dosagem correta, com o consentimento do médico e, de preferência, em um ambiente controlado, familiar, agradável e escutando seus discos preferidos.


não posso ajudar o leitor no que diz respeito à aquisição do produto. Não é legal. Ou, de maneira menos ambígua, é ilegal. Mas o paciente não vai comprar esses cogumelos de um traficante armado e perigoso. As pessoas que lidam com isso se definem como "criadores de cogumelos medicinais". São ilegais porque as autoridades não enxergam que se elas, as próprias autoridades, regulamentassem o comércio dessas plantas, tornando-as legais (não apenas para uso medicinal), o benefício para o país e para toda uma sociedade trabalhadora que sofre assaltos, sequestros, assassinatos e os mais diversos crimes, seria imensurável.


Sim, porque o assaltante tem arma porque lida com a polícia, já que o que ele faz, que é vender drogas, é crime. E, no fim das contas, quem compra a droga e alimenta essa cadeia nojenta, é o mesmo filhinho de papai que foi assaltado e, no mesmo dia, ganhou um celular novo. E melhor.

 

Pois bem, voltando aos cogumelos sem o amparo de arroubos de discurso sociológico. Após pesquisar um bocado, resolvi tomar a Psilocibina, com a aprovação de dois médicos. Mas em casa.


Devo dizer que não tenho nenhuma experiência com drogas recreativas, acho cocaína e heroína as coisas mais decadentes do mundo. Não julgo quem gosta, mas realmente não é para mim. Certa vez passávamos na calçada e a minha esposa falou: "Eita, que cheiro de maconha!". Eu não reconheci, porque nunca estive em rodinhas de apreciação da erva. (Nota mental: lembrar de perguntar à esposa como é que ela conhece o cheiro de maconha.)


Esse texto vai tratar:


  • Da minha experiência com Depressão Maior Refratária;

  • Da minha saga em busca da cura, ou do melhor tratamento;

  • Dos diversos tratamentos existentes, lembrando que o texto se destina a pessoas com depressão ou a parentes dessas pessoas;

  • De explicar, no melhor das minhas possibilidades, o que acarreta a Depressão;

  • E da minha experiência com o a terapia com Psilocibina. Passo a passo.


Eu me deparei com diversos tratamentos que permitiram que, mesmo uma pessoa portadora de uma variante grave de Depressão, que sou, conseguisse levar uma vida moderadamente digna.


Digo isso porque a primeira coisa que algumas pessoas pensam é que o paciente quer tomar uma "droga" para "fugir" da realidade. Mas, embora a Psilocibina possa ser usada como droga recreativa, meu uso foi medicinal. E outra coisa. Tem horas em que a gente não "quer" fugir da realidade. A gente precisa escapar dela com todas as forças.


Não recomendo esse tratamento se você quiser simplesmente ter uma experiência mística, como, também, não nego o direito de cada pessoa adulta ter a sua (experiência). Mas aqui o assunto é outro. Se você é depressivo, já tentou de tudo e nada funcionou, considere com seu médico essa opção.


Cogumelo do gênero Psilocybe, que contém o agente alucinógeno Psilocibina.
Cogumelo do gênero Psilocybe, que contém o agente alucinógeno Psilocibina.

 

A Depressão


Tenho Depressão desde muito cedo - criança -, mas ela foi diagnosticada quando eu tive uma crise abrupta e muito violenta, aos 18 anos. Era Depressão Endógena (sem motivo aparente), Crônica, Profunda e Refratária, ou seja, resistente a tratamentos. A parte do "resistente a tratamentos" eu fui descobrindo com o tempo. Alguns antidepressivos até faziam efeito, após os infames 15 dias de espera (quase todo antidepressivo demora, ao menos, duas semanas para começar a ter um efeito benéfico perceptível - e uma miríade de efeitos desagradáveis). Mas os efeitos positivos duravam só alguns meses, no máximo alguns anos. A parte do "endógena" é porque simplesmente não havia motivo algum para eu ter entrado em depressão. Existe, sim, a Depressão causada por um evento externo. Geralmente é mais fácil tratar. Mas, comigo, ninguém morrera, não sofria bullying, não perdera emprego. Nada.


Fomos, eu e os meus incríveis pais, tentando dezenas de remédios, enquanto eu passeava pelos melhores psiquiatras de Fortaleza, os médicos de doido. Lembro de sempre ter pensado em o quanto tinha sorte de ter uma família que dava total suporte, era completamente despojada de preconceitos, isto é, era muito esclarecida, e de ela ter dinheiro para os médicos e remédios (alguns, caros como você nem imagina).


Uma coisa muito comum é uma pessoa ter depressão e não buscar tratamento porque a família é contra. Ou, ainda, por motivos religiosos. É uma das coisas que mais me revoltam no mundo. O ápice da idiotice em sua quintessência. Um dos meus primeiros médicos já foi me desarmando de qualquer repulsa que eu pudesse ter contra os medicamentos: "Dependente? Você não é dependente de remédios. Você precisa deles, porque eles têm algo que seu corpo deveria produzir, mas não produz. Se você não enxergasse bem, diria ser 'dependente' de óculos? Seria um drama na sua vida?".


Parêntesis 1: Neurotransmissores


Isso me ajudou a ver com mais clareza que o que eu tenho é uma deficiência física, e que, para ter uma vida normal, preciso repor o que me falta, mas que não falta a uma pessoa saudável. Naqueles que têm Depressão, ocorre a deficiência de uma ou mais categorias de neurotransmissores (guarde essa palavra). Os neurotransmissores são umas Moléculas Sinalizadoras, responsáveis por transmitir mensagens (tecnicamente, impulsos neurais) entre os neurônios. Porque os neurônios são separados uns dos outros Entre eles, há uma zona microscópica, mas repleta de atividade, chamada sinapse. Quem faz a ligação de informações entre eles são os neurotransmissores, liberados por um neurônio e entregando a mensagem ao neurônio seguinte, alojando-se na chamada membrana pós sináptica.


Eles também são responsáveis pela "qualidade" da mensagem. Se a mensagem passar por uma abundância de neurotransmissores do tipo Serotonina, por exemplo, ela, de alguma forma que eu não sei explicar, pode adquirir um teor (digamos que seja um pensamento) bem-humorado. Se o pensamento passar pelos neurotransmissores do tipo Dopamina, ele pode vir impregnado de sentimentalismo. Já no casso da Noradrenalina, de certa forma ela ajuda a regular a sensação de estafa, esgotamento.


São esses os três principais tipos de neurotransmissores que faltam ao depressivo. Há outros, evidentemente, mas os principais remédios se concentram em tentar regular esses três. Veja:


  • Serotonina: responsável por regular o apetite, o sono, a memória, o aprendizado, o humor, encarregada de funções que auxiliam o sistema cardiovascular etc.;

  • Noradrenalina: regula a liberação da Adrenalina, hormônio responsável pela preparação do corpo para situações de risco, de emergência ou que animam demasiado as emoções, dentre outras coisas;

  • Dopamina: responsável pelo controle dos movimentos, pela sensação de prazer, de motivação, de emotividade etc.;


Importante frisar que, pelo menos até onde eu sei, os medicamentos não contêm esses neurotransmissores. Não os repõem, simplesmente. A ciência ainda não chegou ao ponto de sintetizá-los. O que os remédios fazem é estimular, no corpo, a sua produção. Ou, mais comumente, inibir a recaptação de algum deles, processo que vou explicar na melhor das minhas possibilidades.


O que ocorre é que, à guisa de exemplo, depois que a Serotonina é lançada de um neurônio para a sinapse (o espaço cósmico entre um neurônio e outro), ela se atrela à membrana sináptica do neurônio seguinte (chamada membrana pós sináptica), transmitindo, desta forma, a mensagem (ela não entra nesse próximo neurônio e não vai carregando a mensagem ao longo de vários neurônios). Uma vez cumprida essa função, o mesmo neurônio que a lançou a recaptura para uma espécie de reciclagem. Essa recaptura é chamada pela ciência de recaptação neuronal. Quando este mecanismo inteiro está desregulado, pode ser que a Serotonina permaneça na sinapse, repassando o impulso neural, por menos tempo do que o normal em pessoas saudáveis, tornando-se, basicamente, ineficaz. Além disso, a recaptação atrapalha a liberação de mais Serotonina. Com o mal funcionamento desse neurotransmissor específico, o enfermo perde as funções que ele exerce, as quais você viu acima.


O medicamento que é possivelmente mais adequado a tratar o caso do hipotético exemplo acima é um Inibidor da Recaptação de Serotonina (IRS), ou, mais ainda, o Inibidor Seletivo da Recaptação de Serotonina (ISRS) que, ao impedir essa recaptura, aumenta a disponibilidade de serotonina na sinapse. A diferença entre os dois (IRSs e ISRSs) é que o primeiro, por não ser seletivo, pode inibir, também, a recaptação de Dopamina e de Noradrenalina e outros neurotransmissores, fazendo um trabalho disperso, enquanto o outro se concentra em inibir exclusivamente a recaptação de serotonina, realizando esta função com mais eficácia. Os ISRSs são os medicamentos mais usualmente prescritos para tratar a Depressão, no mundo inteiro.


Dentre os ISRSs mais conhecidos, temos o Escitalopram (comercializado com o nome Lexapro), a Fluoxetina (antigamente comercializada como Prozac, mas encontrado atualmente como medicamento genérico produzido por vários laboratórios. Os medicamentos genéricos levam o nome da substância ativa, no caso Fluoxetina), Fluvoxamina (Luvox, que por não ter tido ainda a patente quebrada, é comercializado por apenas um laboratório, o que faz seu preço ser dramaticamente alto) e Setralina (Zoloft e os genéricos).


Existem, ainda, os Inibidores Seletivos da Recaptação de Dopamina (ISRDs); os Inibidores Seletivos da Recaptação de Noradrenalina (ISRNs); os Tricíclicos, que são os mais antigos, dos anos 1950, e aumentam a disponibilidade de serotonina e noradrenalina no corpo, mas acarretam muitos efeitos colaterais indesejados; os Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina e Noradrenalina, que têm papel similar ao dos Tricíclicos mas, mais modernos, causam menos efeitos colaterais; os Tetracíclicos, desenvolvidos nos anos 70 e que se parecem com os Tricíclicos, mas atuam em uma quantidade maior de receptores (vamos lá: receptores são as estruturas proteicas que recebem o neurotransmissor na fenda pós-sináptica. Eles são importantes, com poderes até mesmo de transformar o impulso, a mensagem trazida pelo neurotransmissor, mas não vou me extender no assunto.); e os Inibidores da Monoamina Oxidase, que bloqueiam, não a recaptação, mas o desmantelo dos neurotransmissores. Lembram que eu falei que eles passam por um tipo de reciclagem? Essa reciclagem começa com a degradação dos neurotransmissores. A responsável por essa degradação é uma enzima do tipo Monoamina Oxidase (MAO). Os Inibidores da Monoamina Oxidase (IMAOs), portanto, inibem sua ação, também ocasionando o aumento da quantidade de neurotransmissores no cérebro.


Fecha Parêntesis


Dificilmente o médico de um paciente com depressão acerta de primeira o medicamento que o fará melhorar. Porque ele tem que se confiar na exatidão, clareza e lucidez da descrição que o paciente faz dos sintomas. Na primeira consulta o próprio comportamento, o linguajar, a disposição para falar e a prolixidade do paciente, que ainda são desconhecidos, podem ter uma influência enganadora. E ele ainda está sujeito a errar por fatores como a presença de sintomas que não são da depressão, mas que ele não tem como saber.


Além do relato verbal do paciente, existem, ainda, testes (ou escalas) com questões do tipo "nas últimas 6 semanas, você tem tido dificuldade de dormir?", "você já teve pensamentos mórbidos?" "de zero a dez, sendo dez a melhor, que nota você dá ao seu humor?". Isso vai ajudando a montar um panorama para definir que tipo de tratamento (às vezes não envolve medicamentos) o paciente precisa. Com mais consultas, o panorama vai ficando mais claro e completo.


Importante


Quero, também, deixar bem claro que, hoje em dia, pessoas pobres têm vários recursos para tratar a Depressão: aqui em Fortaleza, por exemplo, o Hospital da Universidade Federal do Ceará está sempre selecionando pessoas para testes dos tratamentos mais modernos. Comandados, muitas vezes, pelo Dr. Fábio Gomes de Matos e Sousa, um dos maiores especialistas em psiquiatria do Brasil. Além disso, na Unifor, o Núcleo de Atenção Médica Integrada (NAMI) oferece à comunidade diversos tratamentos gratuitos. Por fim, o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza medicamentos, inclusive antidepressivos, gratuitamente.


 

Então, voltemos à minha história. Concomitantemente aos remédios, tentei também TCC (Terapia Cognitivo Comportamental), com a qual não me dei bem, depois, EMT (Estimulação Magnética Transcraniana). Também nada. Por fim cheguei à psicanálise, cheio de preconceitos e impaciente com a constatação de que o efeito era a longo prazo. Mas a doutora, logo a primeira a que eu fui, era boa. Resolvi muita coisa com ela. E sustento, até hoje o que ela costumava dizer, que todas as pessoas têm demanda de análise. Depois, tive que parar, porque as sessões semanais eram caras e também porque eu sentia que estava me repetindo. Como se o processo estivesse se esgotando. Posteriormente, vi que não. A necessidade de análise pode ser permanente. Ainda vou voltar.


O caso é que, ao longo dos 25 anos desde que fui diagnosticado, passei por muita coisa. O que vou relatar, o faço porque acho que pode ajudar quem está passando pela mesma agonia.


 

Descrição e Episódios


- Na primeira grande crise, aos 18 anos, a tristeza era infinita, eu não conseguia parar de chorar. Tente lembrar ou imaginar a perda de um parente muito querido. Essa dor não se compara à da Depressão (pelo menos nos casos graves como o meu). Pra você ter uma ideia, eu cheguei a perder dois avôs muito queridos e nem senti. Uma tristeza maior sufocava a tristeza da perda. Essa tristeza pode ser definida como angústia, desesperança, desespero. Você não aguenta a própria existência. Quando estou em crise, tenho certeza que nunca vou sair dela. Se sair, não será por cima. No máximo, por baixo.


- Tive choros diluvianos. Às vezes, na frente de gente querida. Gente que eu não queria que me visse chorando. E sem razão alguma, posso lhe assegurar. Eles vêm do nada, geralmente, mas podem ser desencadeados por falas de um certo ex-presidente Bols*¨&% ou por um evento triste, assim. Mesmo assim, eu sempre tentei e vou tentar esconder as crises de choro.


- Meu caso é crônico, ou seja, sempre terei que tomar medicamentos. Não me venha com história de que isso é balela, armadilha da indústria farmacêutica etc. Eu não tenho paciência para argumentar. E sinto muita pena das pessoas que têm preconceito com medicamentos e, acima de tudo, das que precisam de remédio, mas a família proíbe.


- Se você tem Depressão e não quer tomar remédios, você está apenas alimentando seu déficit neurológico. Pessoas com Depressão simplesmente não têm capacidade de lutar contra a insuficiência de um ou mais dos neurotransmissores que, nas pessoas saudáveis, têm seu funcionamento e quantidade regulados. Você não deve negar tratamento médico. Nesse caso, estaria apenas adicionando tristeza ao mundo. E a todos que convivem com você. Mas, principalmente, a você mesmo, que passa a ter uma qualidade de vida muito baixa.


- Claro que os remédios são caros e têm variados efeitos colaterais, mas eles ajudam muito a melhorar a qualidade de vida. Em alguns casos, mas não no meu, a pessoa os utiliza por uns meses, depois para.


- Esses efeitos colaterais, eu senti. Hoje já me acostumei. Dor de cabeça, secura na boca, dificuldade quase surreal de urinar, hipotensão postural (você levanta de uma vez e tudo escurece, às vezes chegando a desmaiar), além de, em muitos casos, afetar dramaticamente a clareza dos pensamentos e da fala. E a libido.


- Fico pensando em uma pessoa pobre que tenha uma Depressão tão forte. Eu sempre defendi que Depressão Maior é um problema de saúde pública, e que os tratamentos deveriam ser fartamente oferecidos pelo estado. Muitos recorrem às drogas e ao álcool. O que você faria?


- Desde o começo da crise maior (18 anos, em 1999), eu só pensava na necessidade de dormir para a dor passar. Eu tenho insônia, então tinha (ainda tenho) que tomar doses altas de Zolpidem pra me derrubar. Houve um tempo em que isso se tornou doentio, um vício, mas eu superei. Foi assim: eu desenvolvi tolerância ao remédio, de forma que tinha que tomar vários comprimidos para conseguir adormecer. Depois de duas horas, acordava e tomava de novo. Eu devia passar umas 6 horas por dia acordado. Tinha que dar aulas (sou professor de violão e flauta). Mas assim que elas terminavam, voltava a dormir.


- Um médico me explicou que o Zolpidem, que eu sempre usei para dormir, é um depressor do sistema nervoso, ele só estava me ajudando a ficar mais deprimido, nessa quantidade.


- Uma outra médica teve que tomar uma atitude drástica: eu iria desmamar do Zolpidem. Teria que dormir só com a Razapina e a Gabapentina que são antidepressivos, mas têm leves efeitos sedativos. O Zolpidem e qualquer vestígio seu desaparecem do corpo em sete dias. Depois disso, o combinado era que eu voltaria a tomá-lo. Dessaturado, meu corpo reagiria melhor a uma dose muito menor. Foi a pior semana da minha existência. Não conseguia dormir senão por algumas horas. Estava no meio de uma crise terrível, em que chorava muito, sentia uma tristeza existencial sem limite e difícil de descrever, sentia a clara sensação de afogamento, puxando com força o ar, como se ele fosse me salvar... Odiei a médica por um tempo. Não só pelos inacreditáveis sintomas da abstinência, que foram muitos (e destaco vigorosamente a letargia), mas também porque ela me fez tomar um remédio específico. Eu tinha tentado suicídio havia pouco tempo, e esse remédio matava a possibilidade de eu tentar de novo. Risperidona, o nome do troço. Só que a verdade é que, se ele tira de você a vontade de se matar, ele tira de você a própria vontade. Você esquece, extravia-se no seu próprio vocabulário, a palavra querer. Seja levantar da cama, ler, assistir a coisa que seja, ouvir música (minha mãe achava estranhíssimo que, enquanto eu tomei esse bendito remédio, eu nunca estava de fone. Em outras condições eu sempre tenho um fone no ouvido.)... Meu estado, nessa semana, foi de insuportável aflição. Como se eu estivesse dentro de uma panela muito quente. Não conseguia ficar parado, mas não tinha forças para levantar, então me revirava pateticamente na cama. Eu implorava por coisas que nem lembro mais e recusava outras que serviam para me dar prazer (como a música, comida...). Mas o que a médica fez foi absolutamente correto e necessário.


- Eu acredito que a grande intenção cósmica, a eterna questão humana, o motivo de estarmos aqui é capturar vivências, informações e sensações para ele, o universo. Para ele. E, no final de tudo, o que ele quer é resolver a dualidade. Saber se, depois do infinito, prevalece o positivo ou o negativo, o esquerdo ou o direito, o certo ou o incerto. Ou o errado. Se o bem é mais forte que o mal, para colocar de uma maneira mais humana. Toda a nossa existência, dos animais, de sabe-se lá qual vida interplanetária, toda a realidade, enfim, tem o único propósito de fazê-lo chegar a uma conclusão de um bit. Sim ou não? Valeu ou não valeu? Pois depois dessa experiência eu digo: nenhum universo, nem toda a experiência humana na terra, nada disso valeu à pena se, para acontecer, alguém teve que passar pelo que eu passei nessa semana de 2017. Horas e horas me revirando na cama de olho arregalado, sofrendo, sofrendo, sofrendo... Foi na época em que saiu o disco "Caravanas" do Chico Buarque. Eu não tive interesse em escutar, no momento (o que, comigo, é muito estranho). Eu lembro de, uma hora (no primeiro dia!), não aguentar mais e pedir para minha mãe ligar para a médica. Qualquer coisa que ela conseguisse pensar para me ajudar. Conseguiu tirar a Risperidona. Ufa.


- Até da Ketamina, de que falo adiante, eu perdi o interesse. O que, no final, foi bom, porque eu passei uns 5 dias sem tomar, desintoxicando e, quando tomei, no sexto dia, ela milagrosamente me animou um pouco. Pouco, mas muito bem-vindo.


- Já tive muita coisa esquisita. Desenvolvi uma terrível enxaqueca com aura. Para quem não sabe, aura é um fenômeno que ocorre com algumas pessoas com enxaqueca forte. No meu caso os sintomas dessa aura (que duravam dolorosos 20 a 30 minutos) eram: eu perdia a capacidade de falar (na verdade eu tentava falar uma palavra, mas saia outra, incompreensível) e perdia o movimento de metade do corpo - o que me levou a uma UTI para tentar diagnosticar, pois nas primeiras vezes eu não sabia que era enxaqueca, pensava que era AVC. Faz alguns anos que eu não sinto esses sintomas, ainda bem.


- Certa vez, em uma aula de Natação para Bebês, eu estava na piscina com minha filha, 2 professores e mais uns 3 ou 4 pais com seus filhos. E o meu cérebro estancou. Eu estava segurando a Beatriz e, a última coisa consciente que fiz, foi entregá-la ao professor. Depois, já um pouco melhor (foi muito rápido) fui andando lentamente até junto dos meus pais e da minha esposa, ficando aos pés dela, que estava na beira da piscina. Saí, com ajuda, sentei, bebi copos e mais copos d´água, fui auxiliado por meu pai, médico, e por um outro, dentre os pais. Eles atribuíram tudo à hipotensão postural. Mas eu estava de pé, e em uma piscina. Eu sei o que foi. Foi a Depressão tentando me dar um golpe de estado.


- Tive dias em que a tristeza e a angústia foram tão fortes, que me marcaram até hoje. Lembro de um DVD do Cocoricó que eu punha para a minha filha. Criei ojeriza, mesmo sabendo que se trata de um produto bom. Palavra Cantada, Pingu, Pocoyo... A música do "Rato, meu querido rato", tudo me causa, ainda, um misto de aconchego e repulsa. A Galinha Pintadinha a gente colocava pouco, por achar que não era tão interessante para ela, mas, às vezes, ela pedia. Não queira imaginar o que é uma pessoa com Depressão ter que ouvir Galinha Pintadinha por horas


- A Bia, minha filha, a Flaviana, minha esposa e minhas sobrinhas são o brilho da minha vida. E meus pais são os pilares mais fortes que alguém pode pedir. Eu tento poupar a Bia da minha doença, mas muitas vezes ela percebe. De qualquer forma eu sou bem claro com ela (tem 13 anos) sobre tudo, inclusive a Depressão e a minha certeza de que ela não vai ter - é acompanhada semanalmente por uma psicóloga desde muito cedo. A psicóloga não é para tratar a minha filha. É para ajudá-la a desenvolver um suporte emocional para a vida inteira. Somos sensíveis.


- Quanto à minha esposa, depois de mim, é quem mais sofre com a minha condição (minha mãe e meu pai também sofrem muito). Na época do Zolpidem ela tentava esconder o remédio até que chegamos a um acordo: eu podia tomar o tanto que quisesse, desde que não fosse escondido, estando subentendido que eu estava em desespero. Às vezes eu implorava.


- O Zolpidem está mais controlado. Porque fiz o desmame do apocalipse, mas logo voltei a tomar, sendo que com mais parcimônia. Considerando que eu cheguei a tomar duas caixas (40 comprimidos) por dia e hoje tomo 6 comprimidos diários, estou no lucro (Editado em 16 de dezembro de 2023: estou tomando 15 comprimidos por dia). Ele ainda é essencial, porque, para mim, um dos piores momentos da depressão era (e ainda é) ficar me revirando na cama sem conseguir dormir. Parece que a dor vem dilatada, nessas horas. Atualmente, eu tomo o remédio (mastigo e ponho debaixo da língua por uns segundos, para, quem sabe, entrar mais rápido na corrente sanguínea) e durmo em pouco tempo. Caso se passem 15 minutos e eu não tenha dormido, peço outro. E mais: de dia, tomo meio comprimido de manhã e meio de tarde. Eles me acalmam, deixam a mente menos confusa e reduzem a perene dor de cabeça. Prefiro tomar esses dois "meios" Zolpidem do que tomar Benzodiazepínicos, como Rivotril e Alprazolam. Estes têm um efeito calmante, mas me deixam completamente amortecido. Além do mais, Benzodiazepínicos têm muitos efeitos colaterais indesejáveis, viciam e fazem você querer tomar cada vez mais. Em casos raros, você pode morrer.


- Cheguei a fazer, em 2011, 12 sessões de Eletroconvulsoterapia (ECT). O famigerado eletrochoque, que, no século XX, era empurrado em qualquer tipo de paciente psiquiátrico. Nessa época, os pacientes, sem qualquer anestesia, recebiam uma carga elétrica na cabeça para tentar reiniciar o cérebro. Era tão desumano que a técnica quase foi deixada de lado, mas alguns resultados positivos levaram os médicos a, em vez de abandoná-la, torná-la menos traumática e otimizá-la. No século XXI, que é quando estou, fiz em hospital, eu ficava anestesiado e sedado durante o processo, e podia ir para casa pouco depois. Só que as memórias desse ano e dos imediatamente anteriores e posteriores são bem esparsas e vagas. É que o efeito colateral máximo do ECT é causar esse tipo de amnésia. Eu me formei em música e não lembro direito da faculdade. Se bem que acho que, aos poucos, fui recuperando algumas lembranças (ou então me contentando com o que tinha), porque, no começo, me incomodou muito, essa perda de memória. Mais ou menos de 2005 a 2014 as memórias são bem fragmentadas. E o pior é que a ECT não me ajudou em absolutamente nada (essa terapia de fato ajuda muita gente, veja bem, não a contraindico). Era o último recurso, e não funcionou.


- De forma quase milagrosa, depois da última sessão de ECT, o médico, que viria a se tornar meu psiquiatra principal, teve a ideia de experimentar um tratamento que ainda estava em situação experimental. A infusão de Ketamina (ou Cetamina, ou, ainda, Quetamina), um anestésico que se usa (ou usava) em bebês (em adultos dá lombra) e em animais. Foi tudo controlado, eu me internava numa espécie de cabine (aliás, a mesma em que fazia os ECTs) e 1ml de Ketamina era injetado na veia, diluído em meio litro de soro, ao longo de 30 minutos. Reitero que 1ml foi uma dosagem calculada com base no meu peso, 90kg. Foi salvador. Eu me senti bem por semanas. O problema desse tratamento é que a melhora, que é substancial, dura só uns 15 dias. Aí eu tomava de novo. Foram umas 4 vezes no hospital. Depois passei um tempo sem fazer e o hospital onde eu fazia foi vendido para a Amil, escapando do escopo do meu médico. Mas consegui me manter por uns meses. Eventualmente, voltei a cair e precisei tomar de novo, semanalmente, agora em casa (tenho um anestesista na família). Aos poucos o efeito foi diminuindo (sou extremamente resistente a tratamentos).


- Hoje, tomo a mesma Ketamina, só que de modo sublingual. Sim, eu passo meia hora com 1ml de Ketamina debaixo da língua. Mais ou menos 2 ou 3 vezes por semana, atualmente. Consigo o produto com amigos veterinários. Na maior parte das vezes ela me dá uma tontura e uma leve melhora, agora. Mas tem vezes em que, não sei por quê, ela simplesmente está em um dia bom e faz milagre. Perdi a conta de quantas vezes esse tratamento me salvou a vida.


- Mas nas primeiras vezes com Ketamina eu tinha alucinações, sensação de relaxamento, tontura (quando, eventualmente, me levantava), sensação de dissociação entre o corpo e a mente, sensação de ser "um com o universo", "conversar com o cosmo", "falar com Deus" (no caso, eu disse a ele que não acreditava nele, ao que ele concordou). E depois, quando passei a tomar por minha conta, como ainda não sabia dosar, experimentei (mais de uma vez) o temível buraco da Ketamina (já pesquisei sobre isso, em inglês se chama K Hole). É uma experiência de que algumas pessoas gostam, até buscam (sim, a Ketamina é usada como droga recreativa, especialmente nos Estados Unidos). Mas eu nunca gostei de alterar meu estado mental. Nunca bebi. Nunca sequer cheguei perto de maconha. Jamais pensei que um dia eu viveria a experiência máxima de um alucinógeno.


-O K Hole (leia aqui)  parece um buraco, mesmo. Não importa se ele é para cima ou para baixo, porque isso nem existe mais. Pode ser um túnel. Eu cheguei a levitar na mente e ver o meu corpo, abaixo. O tempo era infinito. Eu já não era eu, mas toda a existência. Já vi esse efeito ser comparado ao de uma experiência de quase morte. É a completa dissociação entre corpo e mente. Nesse estado, é impossível interagir com outras pessoas. Acho inacreditável que alguém fique desse jeito de propósito, porque é uma experiência, acima de tudo, desagradável. E pode chegar a ser desesperador, tenho vagas memórias de escuridão e desalento, no K Hole.


- Foi triste quando ela perdeu o efeito. Numa ocasião desesperada, lá por 2016 ou 2017, eu não tive efeito no sub lingual. Então, tentei injetar sozinho (jamais faça isso). Peguei uma agulha que nem sei se estava esterilizada, coloquei um pouco de Ketamina e injetei na mão direita. Acho que não pegou veia. Então, tentei na mão esquerda. E pegou, sim. Foi a última vez em que entrei no K Hole. Mas melhorei da crise imediatamente. O problema é que as duas mãos infectaram, ficaram absurdamente inchadas e ardidas. Fui ao hospital (não contei para a minha família que tinha feito tal inconsequência, inventei algo sobre uma queda) e, sem querer, esbarrei a mão direita, que estava menos inchada, numa ponta de algum balcão. Isso abriu um pequeno buraco na pele. Houve uma drenagem ali, mesmo, na recepção. Saiu tanta secreção! Mas, na verdade, isso foi bom, porque a outra, a esquerda, eu tive que operar para drenar. Fiquei meses com um buraco do tamanho de uma seriguela na mão, visitando uma estomaterapeuta samurai japonesa para limpar (dava para ver um tendão branquinho, que a samurai, habilmente e sem cerimônia, friccionava com gaze) e para trocar os curativos.


- A Depressão vive em perene oscilação. A pessoa corre o risco de achar que está boa e, meses depois, ter uma recaída. O ciclo completo dessas oscilações pode durar até mais de um ano (entre você estar bem, cair, e voltar a ficar bem). E, além das oscilações, existe o que eu classifico como micro oscilações. Essas podem durar desde uma manhã até alguns meses. O melhor cenário é você estar no pico da oscilação e, ao mesmo tempo, no pico da micro oscilação. É o que eu chamo de 60%, porque é, mais ou menos onde fica a minha sensação de bem estar. Consequentemente, o pior cenário é o vale da oscilação junto com o vale da micro oscilação. O zero. É desesperador e sua vida entra em colapso.


- Em um dos infinitos vales na oscilação da Depressão, eu consigo lembrar que acordava, toda noite, tendo estado dormindo (por opção) em um colchão no chão, colado na cama em que dormiam a minha esposa e a minha filha, sentindo um frio que não era desse mundo. Todos os pelos do corpo eriçados. E me tremendo convulsivamente. Preparado, eu já deitava agasalhado (eu moro no Ceará, dois anos atrás foi a primeira vez em que eu tive conhecimento e senti temperatura abaixo dos 22 graus em Fortaleza!). Uma calça jeans sob uma calça moletom, uma blusa, uma camiseta de botão e manga longa, um suéter e dois pares de meias grossas. Mas acordava. E não para ir ao banheiro, mas pelo frio, que ninguém mais sentia.


- Eventualmente tive que parar de dar aulas e suspender a minha vida social.


- Lembro de, várias vezes, nas gravações do disco "Jangada Azul", dos Argonautas, - e gravar é a coisa que eu mais gosto de fazer - eu pedir para o Bob (o Ayrton) assumir o controle da produção para eu ir embora mais cedo. Porque sentia angústia, solidão e tristeza exorbitantes.


- Sou uma pessoa bastante empática, mas a maior parte das pessoas me acha, no mínimo, antipático. Às vezes eu penso que estou sorrindo e não estou. Já olhei no espelho. O que eu penso que é um sorriso, na verdade é uma leve, quase imperceptível, contração muscular labial... Isso já me causou muitos problemas e a perda de muitas oportunidades profissionais. E devo já ter irritado um monte de gente.


 

Retirada forçada dos remédios


Por fim, antes ainda de falar sobre os cogumelos, preciso dizer que tive um problema de saúde em 2021. Ele tem importância na história. Nessa época eu estava relativamente bem, tinha uma rotina legal, estava mais vivo. Mas um dia, sem avisar, sem dar um telefonema antes, manifestaram-se pedras na vesícula. Só que elas acarretaram uma infecção generalizada e eu quase morri. Ano passado eu morri, mas esse ano, até agora, ainda não.


Foi assim: um dia eu senti uma dor extrema no estômago, tomei um remédio para gases, que fez melhorar um pouco, mas logo a dor voltou. Era na barriga inteira. Dormi naquela noite graças ao Zolpidem, mas acordava várias vezes, meus pais e esposa checando minha temperatura. Tive febre de 40 graus, o que não era bom sinal. Mas a gente ainda achava que era Covid. Podia ser, certo?


Mas não era. De manhã fomos ao hospital e o médico falou que teria que abrir minha barriga. Lembro de ter entrado na sala de cirurgia e também lembro de quando acordei, pensando que estava tudo bem. Aos poucos, minha família foi me contando, nas visitas à UTI, que tinha sido quase um desastre. Que eu tinha ficado 4 dias sedado e intubado (agora, da desintubação, que foi horrível, evidentemente, dessa eu lembro bem direitinho, mas não passava pela minha cabeça perguntar por que eu estava entubado pra começo de conversa). Pois quando abriram, estava tudo infectado. Eles começaram a remover as pedrinhas, mas o médico chegou a dizer ao meu pai, que acompanhou a cirurgiamédico), que se eu não reagisse à retirada das pedras, tudo o que ele podia fazer era fechar novamente e esperar por la muerte.


Driblando, estranhamente, as expectativas dos médicos, comecei a reagir, e a infecção pôde ser controlada. Tive que tomar antibióticos por meses, fazer sessões diárias de hemodiálise (os rins, que eu agora chamo de ruins, foram muito prejudicados, tendo hoje apenas 39% da capacidade original). Algumas dessas sessões de hemodiálise duravam 4 horas, outras, 8 horas. Depois de uma semana na UTI, fui para um apartamento (compartilhado, porque, na época o hospital estava tomado por pacientes de Covid). Depois de mais algumas semanas, consegui um apartamento só pra mim. Na fase do apartamento eu sempre estava acompanhado, fosse pela minha esposa ou pela minha mãe e meu pai. Mas onde é que eu quero chegar? Aqui: eu estava tomando muitos antibióticos e outros remédios e tratamentos, de forma que, para evitar conflitos e interações medicamentosas indesejadas, precisei quase zerar os antidepressivos.


No começo, imóvel (só conseguia mexer um braço, mas com muita dificuldade) e atarantado, não me incomodou muito. Estava grogue. Depois de, acho, dois meses, voltei para casa, ainda imóvel. E nem sentia depressão. Meu cunhado arranjou uma cadeira de rodas para me levar para as sessões, dia sim, dia não, de hemodiálise. Eu tinha que ser abraçado, erguido e colocado na cadeira. Fiz fisioterapia com uma craque. Fazia xixi num saquinho, deitado na cama, com a ajuda da minha esposa. Após mais um mês, estava me levantando e caminhando, ainda que de maneira canhestra.


E foi que começou a tormenta de novo. A Depressão regrediu a um nível perigosamente desconfortável em poucas semanas. Fomos reintroduzindo os remédios, mas, mesmo quando já estava tomando o exato coquetel de antes da cirurgia, não conseguia atingir o patamar em que eu estava antes dela, que era, (vamos chamar de) "até bom". Digamos, 60% de sensação de bem-estar. Eu voltei todos os remédios (tomo 3 antidepressivos em doses equinas) e não consegui voltar ao nível desejado. O "até bom". O 60%. Nunca mais.


 

As Opções - DBS e Psilocibina


É aí que entram os cogumelos. Porque eu, nesse estado, só tinha três opções: deixar-me enlouquecer; fazer uma cirurgia no cérebro para implante de uma espécie de marcapasso cerebral - o nome da técnica é DBS, Deep Brain Stimulation (Estimulação Cerebral Profunda); ou experimentar alucinógenos. LSD, o chá de Ayahuasca ou a Psilocibina. A cirurgia DBS é caríssima, de forma que eu só tinha, de verdade, a opção de pirar e a do cogumelo.


A ciência ainda não compreendem completamente como os alucinógenos ajudam em doenças psiquiátricas. Há correntes que pregam a microdosagem diária, caso em que o paciente não sente nenhum tipo de delírio, nem nada. Quase nada, digo. Outra corrente sugere que se tome por duas vezes uma dose capaz de fazer a pessoa ter uma experiência mística. O que algumas pesquisas indicam é que essa própria experiência mística está ligada à melhora. Essa segunda corrente é mais bem pesquisada e embasada.


Não me pergunte como eu consegui o cogumelo. Fomos pesquisando, eu, meus pais e meu médico, e chegamos ao acerto de eu tomar duas doses, em semanas consecutivas, de 3,5 miligramas de Psilocibina, que estão presentes em cerca de 3,5 gramas do cogumelo em si. Melhorei. Um tanto. Mas não taaanto. Quando eu falei para o meu médico, posteriormente, que tinha saído dos 20% para os 40% ele foi curto e grosso: tenta de novo. Porque suspeita-se que o efeito pode ser cumulativo. Mas eu paro aqui, na terceira. Descrevo abaixo o resultado de cada tomada.


 

1ª Dose - (Cerca de 3,5mg)


Não tive nenhum efeito alucinógeno. O gosto do cogumelo é horrível. Algumas pesquisas dizem que o efeito terapêutico depende de você ter uma experiência mística, que você tem que "viajar" para ter uma melhora na Depressão. Li em algum lugar (e abaixo, no texto, coloquei vários links para artigos sobre o assunto, alguns dos quais, bem detalhados) a opinião de um médico que dizia que, possivelmente, ao cair no efeito alucinógeno, o paciente se via em controle de tomar decisões que antes julgava impossíveis. E que podia se enxergar de uma maneira inédita e perceber a vida de um outro ponto de vista. Com o acúmulo dessas novas experiências, o paciente se via empoderado (fiquei com peso na consciência por usar essa palavra) e capaz de, simplesmente, decidir se livrar da Depressão. Ou se safar no labirinto da mente e driblá-la. No meu caso, não viajei, mesmo tomando uma dose entre média e alta. Mas eis que, dois dias depois: puf, acordei melhor. Bem melhor, um alívio arrebatador. Lembro de dizer para minha filha: "Bia, sabe o que eu estou? Melhor!" (e do sorriso lindo que ela deu como resposta). Tomei numa segunda-feira. Na quarta, tinha progredido, como disse, dos 20% para os 40% (de percepção de bem-estar). Mas, na sexta, fui voltando a cair.


2ª Dose - (3,5 a 4mg, não tinha como medir)


Uma semana depois, comi, de novo, o fungo. Mesma coisa da outra, melhorei um pouquinho, mas não passei dos 40%. Já estava me dando por satisfeito, porque a maioria dos estudos fala em apenas duas doses. Mas o médico pediu que eu tentasse novamente (o "tenta de novo"). Numa dose um pouco maior, de 4mg. Expliquei a ele que era plenamente possível que eu tivesse tomado, já na primeira vez, esses 4mg, já que não tinha uma balança de precisão. Vieram 5 gramas do cogumelo em um saquinho. Eu descartei o que supus ser, mais ou menos, 1,5g e tomei. Foi assim nas duas vezes. Então, se fosse para haver uma terceira, eu queria tomar uma dose maior, uma que não deixasse dúvida. Só que não queria que ele me receitasse essa dose. Profissionalmente, seria irresponsável. Então, por minha conta (mas, como tenho tentado explicar aqui, foi por uma vastidão de fatores, de modo que não aconselho ninguém a agir sem o acompanhamento médico), fiz mais umas pesquisas, suspeitoso de que tenho resistência à lombra por causa do meu uso da Ketamina e a terrível experiência com o K Hole, e vi o caso de um sujeito que teve uma experiência muito forte tomando 10g do cogumelo. Lembrando, 10 gramas do cogumelo têm, em média, 10 miligramas da Psilocibina, a substância encarregada do efeito alucinógeno. Não tente fazer isso. Enfaticamente, repito: não tente.


3ª Dose - (9mg de Psilocibina, em 9g do cogumelo)


Eu me vi com uma dúvida. Tomava 4mg? E, se não funcionasse ia subindo gradativamente até chegar a uma dose que me pusesse em contato com a sopa cósmica? Eu não queria isso. Queria que fosse a última dose por, pelo menos, um ano. É que os estudos apontam que os benefícios dos cogumelos alucinógenos duram, pelo menos, um ano. Mas pode durar muito mais, ninguém sabe. Eles dizem um ano porque os estudos acompanham os pacientes, geralmente, por esse período. A verdade é que os cientistas não conhecem um prazo certo, por uma série de fatores. Os estudos com alucinógenos são bem recentes. Além do mais, dificilmente um ramo de pesquisas ainda tão incipiente e experimental vai ser subsidiado por mais do que um ano. Voltando à minha experiência. Tomei 9 miligramas de Psilocibina. Essa dose foi, para mim, mais satisfatória. Dose igual, em outra pessoa, acarretaria perigosas e complicadas complicações. Tomei na cama, ouvindo essa playlist. As Variações Enigma, de Edgar Elgar, me pareceram a coisa mais mágica e perfeita do mundo. As outras doses me deram uma baita dor de cabeça. Essa, não. Mas também não consegui sentir qualquer efeito alucinógeno. Agora, tenho certeza que tenho tolerância cruzada a isso com a Ketamina. O fato é que melhorei muito. Senti uma calma, uma paz e um relaxamento super agradáveis. Mas reitero, essa dose não é recomendável, principalmente se você nunca tomou na vida uma substância que altera a consciência. Na verdade, o que fiz foi o exagero do exagero. Eu tomei por causa da resistência a experiências psicodélicas que desenvolvi com por causa da exposição repetida à Ketamina (e seu famigerado K Hole). A dose recomendada pelos estudos é sempre de 3,5 miligramas de Psilocibina, ou seja, 3,5 gramas do cogumelo. O que eu fiz foi a loucura da vez, digamos. Foi uma quantidade exorbitante, mas eu, que sempre fiz tudo isso de maneira cuidadosa e estudada, tive que arriscar. Principalmente para não ter que ficar tomando mais e mais. A verdade é que eu não gosto de efeitos psicodélicos, nem da Ketamina, nem da Psilocibina, e tenho certeza que não gostaria de drogas recreativas. Não experimentei Psilocibina por diversão, mas pelo efeito posterior, que é de reequilibrar os neurotransmissores. De forma bem resumida, é isso que o cogumelo, ou melhor, a experiência alucinógena, faz. De alguma misteriosa forma ela reorganiza os neurotransmissores, isso é cientificamente comprovado. Regiões inteiras do cérebro literalmente crescem em tamanho. Isso só funciona em quem tem depressão ou algum mal neurológico, pois o cérebro dessa pessoa está corrompido, fisicamente deformado.


Mas não. Não tive melhora significativa, no final das contas.


 

Como estou hoje


Escrevo esse texto alguns dias depois dessa travessura (que hoje percebo como irresponsabilidade) de terceira dose. Considero que estou melhor. Estou mais ativo, resolvendo minhas coisas, voltei a compor e tocar violão, não tenho mais crises de choro. Mas não tive, também, uma remissão. Continuo tomando os remédios:


  1. O triplo da dose normal de Fluvoxamina (300mg);

  2. Uma dose surreal de Lisdexanfetamina (140mg);

  3. 45mg de Mirtazapina;

  4. Ketamina sublingual 3 vezes por semana;

  5. Zolpidem (até 60mg por dia);

  6. Um bocado de outros fármacos cujo nome eu nem lembro.


Tudo isso pode levar a crer que eu abuso dessas substâncias. Na verdade, não abuso, não. São as chamadas prescrições off label, aquelas em que o médico prescreve uma dose superior à recomendada na bula, em casos muito graves e que não respondem a doses comuns. Lembrem-se que eu estou nesse caminho há 25 anos, sem contar os anos de infância e adolescência, em que eu não estava diagnosticado, mas tinha severas crises. Eu sabia onde estavam escondidos os 4 revólveres aqui em casa, do meu avô.


O meu caso é muito sério. Ele justifica medidas drásticas. Só eu sei. Tentei tudo, foram dezenas de medicamentos diferentes e em combinações diversas. E sei que muita gente no Brasil, em Portugal e no mundo tem Depressão nessa mesma gravidade. A essas pessoas, eu encorajo, sim, conversar com o médico sobre essas metodologias exóticas. Nunca fiz algo que não estivesse cientificamente bem evidenciado. Também nada fiz sem acompanhamento do médico e da família. E jamais fiz algum tratamento antes de ler exaustivamente sobre. Portanto, se você se encontra em situação de desespero emocional (especialmente se não houver nenhum motivo aparente), procure um psiquiatra. E não, ele não é médico de doido. É o médico da consciência.


É sempre bom já ir ao médico munido de informações sobre esses tratamentos. Um bom psiquiatra (como o meu, que virou um bom amigo) sabe tudo o que está acontecendo no mundo das pesquisas científicas para o tratamento de Depressão. Um mal psiquiatra vai mandar você meditar, fazer exercícios físicos, pegar sol, mesmo se o seu caso for claramente mais do que uma Distimia ou uma Depressão Menor e for eletivo para tratamento com medicamentos. Se o seu médico julgar que não é o seu caso, tudo bem, até certo ponto. Porque ele deve, então, aparecer com uma solução melhor. Existem dois tipos de psiquiatra incompetente: aquele que, imediatamente, prescreve um monte de remédio, tendo ouvido apenas um breve relato dos seus sintomas; e o que não quer passar remédio de jeito nenhum, porque acha que "você é tão jovem, tão bonito... vai curtir essa vida!". Se fosse para ouvir isso, eu ligava para minha tia. Procure outro. Que leve a sério a sua condição.


Só digo uma coisa: não aceite ficar mal. Depressão é uma distorção química, um defeito, às vezes, genético, até. A qualidade de vida de um portador pode variar de baixa a insuportável. Eu nunca me conformei e continuarei não me conformando. Graças a essa atitude, fui até os confins do universo atrás de melhorar. E melhorei e piorei alternadamente em várias épocas, mas consegui escapar do maior problema na vida de um depressivo e de sua família: o suicídio. Não que eu não tenha tentado, ou idealizado, mas, às vezes, quando não tinha mais o que fazer, quando a dor de existir estava me matando, eu vinha para a internet pesquisar sobre novos tratamentos. Sempre tem um. E tudo o que eu queria era ler um texto como esse que você está vendo aqui. Que dissesse, enfim, que, antes do suicídio, existem muitas coisas que você pode fazer para melhorar. E, se você estiver considerando o suicídio, então nada custa tentar medidas extremas para evitá-lo.


O telefone do Centro de Valorização da Vida é 188. Ele está disponível 24 horas por dia, grátis. Eles têm 3.500 voluntários atuando em 20 estados brasileiros, mais o Distrito Federal, dispostos e capacitados a ajudar. Também atendem pelo endereço de e-mail apoioemocional@cvv.com.br.


 

Editado


16 de dezembro de 2023. O resultado a longo prazo da ingestão do cogumelo que contém Psilocibina não foi satisfatório. Pouco a pouco, mas de maneira obstinada, incansável, a depressão foi voltando. Lentamente, seus efeitos, velhos conhecidos meus, foram ressurgindo e se intensificando até se tornarem insuportáveis. A tortura vem de dentro.


Estou, no entanto, moderadamente esperançoso. Meu Plano de Saúde acatou cobrir os astronômicos custos da cirurgia de DBS, Deep Brain Stimulation (Estimulação Cerebral Profunda). Se eu fosse fazer no modo particular, gastaria mais de 300 mil reais. Mas, graças à insistência do meu pai com o Plano de Saúde, à sua tenacidade e à sua crença na possibilidade de uma melhora significativa, a cirurgia vai acontecer. E em menos de um mês.


A Estimulação Cerebral Profunda é feita com o implante de dois eletrodos e um neuroestimulador em uma localização específica, altamente precisa e profunda, do cérebro. Os eletrodos, chamados de Geradores de Impulso Implantados, ficam produzindo pulsos elétricos de alta frequência. Por algum motivo, que a própria medicina admite obscuro, a continuidade dessa estimulação elétrica reorganiza os neurotransmissores. Por suas características o DBS recebeu o apelido de Marca-Passo Cerebral. A terapia foi desenvolvida para o tratamento da Doença de Parkinson, da Síndrome de Tourette, da Dor Crônica, da Distonia Focal, da Epilepsia e de outros problemas neuromotores. Desde 1997, quando foi aprovada nos Estados Unidos para tratamento de Parkinson, os resultados foram acima do esperado.


Pouco a pouco o DBS foi se ramificando e se especializando também em doenças neuropsiquiátricas, ainda que em condição experimental. Aliás, é experimental até hoje, para depressão. A eficácia é maior do que qualquer combinação de remédios (eu tomo 3 tipos de antidepressivos, Carbolitium no dobro de sua dosagem usual e medicamentos para dormir).


Para cada doença que se deseja tratar, há um protocolo diferente e a região do cérebro a ser estimulada é milimetricamente definida, através de um mapeamento preciso feito na hora do implante. Os eletrodos não ficam lá, soltos, dentro do seu querido cérebro. Dele saem fios que conduzem a um aparelhinho, que fica fora do corpo e guarda as baterias. Estas precisam ser trocadas em uma periodicidade ainda a se ver.


Pois vamos. É mais uma jornada. Quem sabe, a última. Ou melhor, penúltima, de um jeito ou de outro. Sinceramente espero que esse texto esclareça, especialmente, sobre a Depressão Maior em si e sobre a infinidade de tratamentos disponíveis, para que o leitor que esteja passando por isso se sinta encorajado a não desistir.


A propósito, eis que, recentemente, me deparo com o vídeo a seguir, a respeito da terapia com Psilocibina. O cientista menciona o que ele chama de "Dose Heroica", aquela que tem melhor efeito, nos estudos dele. 40mg de Psilocibina!




 

Veja alguns links em português, em linguagem leiga:









Abaixo, uns links para o caso você entender inglês. Estes são mais científicos/acadêmicos:







 

Comentem aí! À vontade. Só não permito comentários com discurso de ódio, de preconceito e com palavreado chulo.


As postagens da Arara Neon, nós resolvemos dispô-las em lista, em uma única postagem.


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