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  • Foto do escritorNílbio Thé

Graphic Novel noir queimada no papel

Atualizado: 5 de out. de 2020



Eventualmente no mundo das artes surgem obras que revolucionam a linguagem. Seja por criarem novos paradigmas, novas técnicas, destruindo ou ressignificando as antigas, ou por explorarem ao máximo todas as possibilidades daquela linguagem. Nos quadrinhos, exemplos não faltam, mas, para ficar em apenas dois, cito: Asterius Pollyp, de Dave Mazzucheli, em que tudo é usado como instrumento narrativo, desde o formato dos balões até as cores das fontes das falas de cada personagem; e os quadrinhos jornalísticos criados por Joe Sacco.


Pois bem, Cidade de Sangue também entra nesta categoria, o que só confirma o nível de qualidade que os artistas independentes têm conseguido ultimamente. Financiado através de edital do Fundo de Arte e Cultura de Goiás, da Secretaria de Educação, Cultura e Esporte, e editado numa luxuosa brochura com sobrecapa e marcador de tecido pela MMarte editora, temos uma obra que se distancia dos estereótipos normalmente vistos em trabalhos realizados com dinheiro estatal: uma história policial, noir e violenta.



Logo no prólogo somos transportados para 1995, em Goiânia. O assassinato brutal de uma família. Cerca de vinte anos depois, a cidade parece um balneário de sangue e é isto que dá sustento ao jornalista policial Carlão, cujo editor Palhares (um sobrenome clássico para uma história dessas!) tem prazer em extrair manchetes do sangue e da violência da cidade. Carlão não aguenta mais uma rotina de tragédia, morte e violência, inclusive isso começa a atrapalhar seu próprio casamento. Tudo começa a mudar com a chegada de Paulinha, repórter fotográfica que acaba de voltar de uma temporada de estudos na Europa para trabalhar no jornal, justamente na editoria de polícia.


Argumento da animadora Márcia Deretti que foi transformado em roteiro por seu esposo, Márcio da Paixão Júnior, e ilustrado por ninguém menos que Júlio Shimamoto. A história de estrutura noir tem um tratamento neoexpressionista com os desenhos feitos com uma técnica criada por Shimamoto, que utiliza uma caneta de madeira cuja ponta é feita de resistência elétrica e desenha sobre papel térmico (do mesmo tipo que se usava nas antigas impressoras de fax).


O resultado dessa junção de uma história tão naturalista e noir é um trabalho de um preciosismo que pode ser comparado somente com a revolução que Rubem Fonseca fez na literatura policial brasileira. Os quadrinhos brasileiros acabam de sofrer uma pequena revolução numa história cheia de reviravoltas e de visual magnífico. Agora é torcer por uma distribuição boa (outro grande gargalo dos artistas independentes de todas as linguagens) para todo o país.


O livro foi publicado pela editora MMarte, contudo encontra-se esgotado. Publico essa resenha aqui como forma de pressão para que ele volte a ser editado. Esperança em tempos como esses é luxo, mas ao mesmo tempo não custa nada!

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