O Mistério do Trágico Incidente Dyatlov
- Rafael Torres
- 25 de mar.
- 10 min de leitura

A Terra tem muitos mistérios. O mistério é ter gente que acha que ela é plana. Outro mistério: como foi que o mundo se tornou tão desagradável? Se reduzíssemos a humanidade ao ideal de certas pessoas, só haveria: homens, loiros, altos, héteros (sei lá como, pois não existiriam mulheres), armados e com camisa xadrez. E nenhum deles poderia pilotar um avião. Não acho seguro.
Tá bom, estou pensando alto. O que eu quero falar aqui é daquele que me parece um dos maiores mistérios da história. O Incidente Dyatlov. Eu tive minha fase, quando a internet era mais incipiente, de bancar o detetive e buscar respostas ou conjecturas sobre grandes enigmas. Não tenho mais, a maioria parece bobagem. O Mary Celeste, por exemplo: pode ter sido uma tempestade, ou então o capitão pirou e matou todo mundo. Ou acharam uma ilha tão bonita que quiseram ficar lá. Amelia Earhart tenho quase certeza que caiu. Mas o Incidente Dyatlov é o diacho. Simplesmente não tem explicação. Vamos do início.
Em fevereiro de 1959, Rússia, um grupo de 10 esquiadores e esquiadoras, liderados por Igor Dyatlov (pronuncia-se Diatlov, não Daiatlov), partiu em uma expedição pelos montes Urais. Eles queriam chegar ao monte Otorten, a 10 Km de onde partiram. Um dos esquiadores ficou doente e voltou, restando apenas 9.
Os Personagens
Os nomes russos são constituídos pelo prenome + o nome do pai, seguido de vich ou evich + o sobrenome do pai.
Abaixo: Nikolay Vladimirovich Thibaux-Brignolelle, Rustem Vladimirovich Slobodin e Semyon Alekseevich Zolotaryov;
Zinaida Alekseevna Kolmogorova, Georgiy Alekseevich Krivonischenko, Igor Alekseevich Dyatlov;
Yuri Nikolaevich Doroshenko, Aleksander Sergeevich Kolevatov, Ludmila Aleksandrovna Dubinina.
O Incidente
O grupo estava animado. A trilha era difícil, mas todos eles tinham experiência. No dia 1º de fevereiro eles acamparam numa passagem conhecida como Kholat Syakhl, que significa Montanha dos Mortos na língua Mansi, do povo local. Ou, então, Montanha Estéril.
Hoje o lugar é conhecido como Passagem Dyatlov. - não há quem traduza essa coisa? Não há consenso sobre nada a respeito do Incidente Dyatlov? Verão que não.
Até quando acamparam, tudo estava bem, os diários e fotografias nos certificam disso. Mas de madrugada alguma coisa aconteceu. Alguma coisa fez aqueles 9 jovens abandonarem o calor de sua barraca e irem procurar refúgio na floresta, a cerca de 1.500 metros da clareira onde estavam.
Eles saíram da barraca, não pela porta, mas por cortes feitos à faca no pano da lateral. Alguns saíram de meias, outros com apenas um sapato e outros, ainda, descalços. O frio era desesperador, cerca de - 30º C. As pegadas indicam que eles não estavam correndo em desespero, mas que saíram ordenadamente.
Semanas depois, quando eles não apareceram, as autoridades começaram a encontrar os corpos. Foram encontrados nos mais diversos lugares. Alguns fizeram uma fogueira sob as árvores, mas morreram de frio, mesmo assim (estavam só com a roupa de baixo), outros caíram de uma ravina, outros morreram de hipotermia ao tentarem voltar para a barraca. No final das contas nenhum dos nove apareceu no ponto final.
Uma das moças tinha a língua decepada e estava sem os olhos (dizem que pode ter sido algum animal ou até mesmo o frio, mas muitos questionam essas hipóteses). Um outro tinha levado uma pancada no peito comparável à de um atropelamento. Outro estava sem a orelha! Outro, ainda, tinha um buraco na parte frontal da cabeça.
Na árvore, os galhos tinham sido quebrados até 5 metros de altura, dando a entender que alguém tinha subido para olhar a barraca.
Um pouco sobre Semyon Zolotaryev
- Um dos membros do grupo, Semyon Zolotaryev, era, no mínimo, estranho. Ele não era do grupo; tinha uma certidão de nascimento com data diferente da que constava no cartório; era bem mais velho (38) que os outros do grupo; tinha várias tatuagens (incomum, em 1959) incluindo um pentagrama; tinha dentes de ouro; era solteiro, o que era estranho, na sua idade; suspeita-se que trabalhasse para a KGB; e o pior de tudo: o DNA (mitocondrial) do corpo atribuído a ele não combina com o dos seus sobrinhos. Como se jamais tivessem enterrado o verdadeiro corpo de Semyon.
Em seu favor, havia se entrosado com o grupo porque era divertido, cheio de histórias da 2ª Guerra e ainda tocava música para dançarem (e sabia várias). E, de qualquer forma, se alguém matou o grupo, não levou qualquer pertence deles (câmeras, diários, dinheiro...).
Uma teoria diz que ele forçou os outros a sair da barraca, andar até a floresta, e os matou. E achou alguém para servir de corpo em seu lugar. Tá bom, improvável.

Investigação
A investigação subsequente demonstrou que: três morreram de ferimentos ou pancadas e, seis, de hipotermia; a possibilidade de avalanche era baixíssima (era uma passagem relativamente plana e o grupo saberia onde acampar para fugir da possibilidade de uma. Além disso, eles fugiram montanha abaixo, exatamente para onde uma avalanche correria); eles não foram atacados pelos Mansi e nem por algum animal selvagem, pois não havia pegadas que o indicassem; havia radiação nas roupas deles (o que pode ser explicado pelo fato de que alguns trabalhavam, na universidade, com produtos radioativos); a pancada em um dos rapazes foi fatal e tem uma particularidade: não pode ter sido causada por alguma criatura, pois não havia dano na pele dele, o ferimento era interno! Durante o funeral, as pessoas notaram que eles todos tinham um bronzeado laranja bem forte.
Os primeiros a serem achados, em 27 de fevereiro de 1959, foram Yuri Nikolaeevich Doroshenko, Yuri Alekseevich Krivonischenko, Igor Alekseevich Dyatlov e Zinaida Alekseevna Kolmogorova. Estes morreram de hipotermia. Mas há um porém: Doroshenko tinha (revelado depois, na autópsia) um edema pulmonar e uma concussão pulmonar; Krivonischenko tinha queimaduras de 3º grau e Dyatlov vomitara sangue. Kolmogorova tinha um hematoma em forma de batom, na cintura.
Em 5 de março do mesmo ano, foi encontrado o corpo de Rustem Vladimirovich Slobodin. Possuía um trauma craniano que nunca se soube explicar. Os corpos restantes, de Lyudmila Aleksandrovna Dubinina, Aleksander Sergeevich Kolevatov, Nikolay Vladimirovich Thibeaux-Brignolle e Semyon Alekseevich Zolotaryov, foram achados pelos nativos locais Mansi, meses depois de mortos.
A pergunta não é nada sobrenatural. Na verdade, é bem simples: por que 9 jovens abandonam a aparente segurança de uma barraca, alguns só de cueca, e não voltam posteriormente pra ela? O que houve naquela tenda?
A cada década surge uma nova teoria, recebida sem entusiasmo: nenhuma conseguiu explicar cada um dos aspectos do Incidente Dyatlov.
Para completar, você vai achar que estou brincando, mas duas outras expedições em locais próximos relataram ter visto OVNIs (OVNI não quer dizer Disco Voador, mas simplesmente um objeto voador não identificado) verdes sobrevoando o local.
Pronto, mais um mistério para a história do nosso planetinha redondo. Para esse, duvido que você encontre resposta. Eu fico arrepiado pensando se eles ouviram algum rugido assombroso e correram, se tiveram um acesso de loucura coletivo, se houve um vento sobrenatural, um barulho subgrave...
Recentemente deram novo "veredicto": houve uma avalanche, fugiram da tenda, alguns morreram de hipotermia, outros de uma queda. Ponto. Só que isso está longe de ser satisfatório. Por que correram para tão longe? Por que, ao menos, não agarraram umas roupas (enquanto várias pessoas saem por um buraco na sua frente, há tempo de você puxar sua mochila)? Como não havia sinal de avalanche? Os investigadores da época descrevem com clareza as pegadas que saíam do acampamento... Imagino que, se houvesse avalanche, isso não seria possível.
Editado em 26.09.2020
Algumas teorias e por que elas não funcionam
1. Avalanche – É tentador acreditar que tenha sido uma "simples avalanche", mas não havia sinal de deslizamento no local. A barraca ainda estava levantada, apoiada em pás de esqui, também ainda em pé. A neve que cobria parte da tenda tinha caído de cima, passaram-se 20 dias até que os corpos fossem descobertos. Além disso, a hipótese de avalanche foi levantada desde a primeira investigação, já na época e considerada fraca. Eles eram experientes, se houvesse essa possibilidade estariam mais agasalhados. Além disso, ela explica alguma parte da situação, mas só se combinada à teoria do Vento Catabático. E, sendo ela tão forte, teria derrubado a barraca. Por fim, se ouviram sinais de avalanche por que de tentaram abrir a barraca por dentro? (deve demorar). Saíram sem pressa e com pressa ao mesmo tempo?
2. Assalto – Um assalto a mão armada - Os oficiais foram bem claros: havia 8 ou 9 pares de pegadas saindo da tenda, não mais. Além disso, por que eles teriam feito um corte lateral na tenda, em vez de sair pela entrada?
3. Ataque pelos Mansi – Homens Mansi foram torturados pelas (covardes) autoridades, segundo alguns documentários. Mas mesmo sob tortura a história que eles contavam era que tinham encontrado os esquiadores quando eles iam entrar na montanha, e os alertaram para que não fossem por ali. Era a Montanha dos Mortos. As histórias dizem que tinha esse nome porque os Mansi não encontravam nada pra caçar naquela região (a tradução pode ser "Montanha dos Mortos", mas também pode ser "Montanha Estéril"). Há, ainda, a lenda de 9 Mansi que teriam morrido no lugar em circunstâncias jamais elucidados.
4. Um som subgrave que eles teriam confundido com uma avalanche se aproximando – Um infrassom muito específico, de alguma natureza, os teria posto em desespero, pensando tratar-se de avalanche - Mas não explica por que eles saíram “de maneira organizada” e sequer pegaram alguma mochila. Além do mais, na direção para a qual andaram, jamais teriam conseguido correr do que pensavam ser uma avalanche por 1.5 km.
5. Vento catabático – É um vento que vem encosta abaixo, carregando um ar de alta densidade. Mas esse vento teria derrubado a barraca.
6. Ieti – Não preciso falar sobre Ieti, mas vou. Defensores dessa "teoria" sustentam que havia pegadas enormes no local, mas as autoridades não documentaram. Além disso, em uma das últimas páginas do diário do grupo, que era todo escrito de forma irônica e brincalhona, eles escreveram “agora sabemos que o homem das neves é real”... Tá. Então o monstro os teria atacado e perseguido por mais de 1 km e depois matado um por um só por matar? Ou então teria sido responsável pela saída deles da tenda e dado uns golpes em alguns e, posteriormente, eles, não conseguindo voltar ao acampamento, teriam morrido de hipotermia? Amigo, se você quer acreditar nisso, vá em frente.
7. Frozen - Quando estavam produzindo o filme Frozen, desenvolveram um algoritmo do comportamento da neve que chamou a atenção de dois cientistas suíços. Fizeram simulações de computador a respeito do caso Dyatlov. Elas mostraram uma nova possibilidade: a de uma slab avalanche (algo como avalanche em bloco), que, segundo os cientistas e animadores do filme, explicaria, por exemplo, as escoriações e fraturas de alguns. Essa avalanche, diferente da de neve, é de gelo, o que explicaria os golpes que alguns sofreram, que foram comparados, na época, aos da onda de impacto de uma grande bomba. Mas não explica como eles escaparam, todos, do deslizamento e por que não voltaram depois. O vídeo abaixo detalha essa tese.
8. Surgiu, recentemente, da boca do canal National Geographic, a hipótese de que o grupo tenha sido assassinado por seu ex-integrante Yuri Yudin, que havia ficado para trás. Mas essa tese é tão leviana que eles não se preocupam em explicar nada do incidente. E, muito menos, de explicar as inconsistências.
9. Testes militares – Talvez alguma arma nuclear da própria União Soviética tenha atordoado o grupo, com um calor e uma radiação absurdas. O problema é que haveria marcas, pistas dessa detonação. E a barraca, novamente, não estaria íntegra.
10. Despir paradoxal - Uma explicação que só valeria para alguns dos membros do grupo, o despir paradoxal é um fenômeno que ocorre com certa frequência. O corpo "confunde" o frio com o calor e a pessoa se despe. Estatisticamente, esse fenômeno é responsável por quase metade das mortes por hipotermia. Mas, para mim, explica nada.
Pontos a se observar
- A maioria deles tinha alguma pancada muito violenta. Pode ser que quatro deles tenham caído de uma ravina, de uma boa altura, mas e os outros?
- Um deles morreu com um papel em uma mão e uma caneta na outra, como se estivesse prestes a escrever algo.
- A causa oficial da morte, na investigação de 1959, foi “por uma força desconhecida”.
- A entrada da barraca não tinha zíper, mas botões, o que, pela demora de desabotoar, poderia ter levado o pessoal a fazer um corte na lateral da tenda.
- Alpinistas e trilhadores de caminhos muito gelados não tiram as roupas de frio nem para dormir, principalmente quando, lá fora, está fazendo – 30º.
- Uma das câmeras do grupo nunca foi encontrada (oficialmente).
- Um dos diários, também não.
- Um puttee, ou obmotki, que é uma espécie de bota que militares usavam, foi encontrado perto dos corpos. Não pertencia a nenhum deles, segundo parentes e o amigo (Yuri Yefimovich Yudin) que faria a viagem com eles, mas teve que voltar.
- Eles não pegaram roupa, mas tiveram tempo de pegar uma câmera e uma lantena.
- A radiação encontrada nas roupas deles era muito maior do que o esperado de quem trabalha em laboratórios, como alguns.
- Sobre Yuri Yudin, já foi dito "ou ele é um cara muito sortudo, ou é o assassino. Eu investigaria mais Semion Zolotaryev".
- Quanto mais você investiga, mais esquisito fica.
- As mais recentes expedições e os mais recentes estudos para elucidar o ocorrido (o último ocorreu em 2021) são mais fantasiosas que o próprio ocorrido; envolvem ventos catabáticos e um tipo específico de avalanche - a slope avalanche.
- Não é apenas um caso de morte. É preciso explicar por que eles sobreviveram na barraca e não, na árvore.

Leia mais:
Em inglês:
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